segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Personalidades Negras – Luislinda Valois



Nascida no Estado da Bahia em 1942, Luislinda Dias de Valois Santos se mostrou lutadora contra o racismo ainda criança. Filha de motorneiro e de costureira, aos nove anos teve seu primeiro embate em uma sala de aula quando um professor a desprezou pela simplicidade de seu material escolar. Ele afirmou que se ela não podia comprar o material adequado, não devia estar estudando e sim cozinhando feijoada para brancos.
Foi nesse momento que surgiu a determinação da mulher que se tornaria, em 1984, a primeira negra a exercer o cargo de magistrado e a primeira a sentenciar, em 1993, tendo como base a Lei do Racismo no Brasil. Luislinda já foi homenageada e premiada em diversas esferas públicas e entidades no país e no exterior pelos projetos de inclusão e acesso à Justiça que desenvolveu nas comarcas pelas quais passou.
Consciente de que é parâmetro de sucesso para a raça negra, defende o sistema de cotas, acredita que a Lei contra o Racismo ainda não é muito bem utilizada e afirma que o preconceito existe, sim, no Brasil, apesar de velado. Como exemplo, faz questão de lembrar que já foi vítima de preconceito no exercício da magistratura, mas afirma que com simplicidade, sinceridade e altivez sempre resolve essas situações.
Fonte: FCP

Castro Alves - Espumas Flutuantes (excerto)

“E amamos – Este amor foi um delírio…
Foi ela minha crença, foi meu lírio,

Minha estrela sem véu…
Seu nome era o meu canto de poesia,
Que com o sol – pena de ouro – eu escrevia
Nas lâminas do céu.

“Em teu seio escondi-me … como a noite
Incauto colibri, temendo o açoite
Das iras do tufão,
A cabecinha esconde sob asas,
Faz seu leito gentil por entre as gazas
Da rosa do Japão”.
(Dalila, p. 130)

Documentário vai mostrar preconceito contra cabelo afrodescendente




Redação Correio Nagô – Universitários de Curitiba (PR) estão procurando mulheres que já ouviram comentários pejorativos em relação ao cabelo afro para participar do documentário "Qual é o Pente Que Te Penteia?".
Definido como uma produção universitária independente, o documentários, segundo a produção, tem como objetivo “mostrar a relação da mulher afrodescendente com o seu cabelo”.

“A ideia é traduzir a diversidade, as peculiaridades da afrodescendência, ressaltando esse elemento forte, que é o cabelo. Uniremos as imagens aos depoimentos das mulheres a respeito de episódios em que foram vítimas de comentários de origem racista”, ressaltam.
A produção está à procura de mulheres afrodescendentes que: já ouviram comentários pejorativos em relação ao seu cabelo afro; cresceram duvidando do próprio potencial de beleza em função de uma incorporação do comportamento racista ainda presente na sociedade; compreendem a intensidade do simples ato de soltar os cabelos e como isso pode reforçar a sua identidade e que queiram contar seus relatos.

Se a candidat se identifica com pelo menos um destes tópicos ou tem outro ponto interessante a ser sugerido e compartilhado, deve mandar email para opentequetepenteia@gmail.com ou preencher formulário no site http://opentequetepenteia.wix.com/opentenquetepenteia
As gravações estão previstas para o mês de outubro em Curitiba, em horários que serão agendados previamente com as voluntárias. Se a mulher mora em outra cidade ou outro estado, deverá entrar em contato para obter informações de como fazer pra participar.

Editais investem R$2,3 milhões na produção cultural negra



Redação Correio Nagô – Até o dia 15 de novembro, estão abertas as inscrições para os Editais Palmares 25 anos: 1º Imagens da Memória e 3º Ideias Criativas. O lançamento dos editais será realizado, nesta terça-feira, 1º de outubro, às 10h, no auditório da Fundação Cultural Palmares, em Brasília. A FCP vai investir R$2,3 milhões em ações para o registro e dinamização das culturas negras brasileiras.

“Os certames representam mais uma estratégia da FCP – MinC para registrar e promover a memória e a resistência negra no Brasil”, divulgou a FCP. Hilton Cobra, presidente da FCP, avalia que a iniciativa é parte do empenho da Fundação rumo a uma política pública de cultura que contemple os produtores e artistas negros(as).

“O mecanismo de chamada pública/edital é o meio que temos, atualmente, para expressar nosso intuito de ver as produções artísticoculturais negras efetivadas e circulando por todos os cantos do Brasil”, disse.

Imagens, histórias e memórias negras – A sabedoria negra é levada pelas gerações por líderes: anciãos e anciãs que guardam na memória conhecimento, sua história e identidade. E com o objetivo de registrar os depoimentos desses mestres e mestras, a FCP elaborou o 1º Edital Imagens da Memória.

A premiação de R$1,3 milhão, recurso do Fundo Nacional de Cultura, será distribuída para 12 obras audiovisuais que irão captar as narrativas de mulheres e homens negros das comunidades quilombolas, tradicionais de matriz africana e ícones das manifestações culturais afro-brasileiras sobre de temas diversos, adotando as histórias sobre a escravidão como parâmetro prioritário para os registros.

Criatividade negra – Já a terceira edição do Edital Ideias Criativas, com apoio da Secretaria da Cidadania e da Diversidade Cultural, vai destinar R$1 milhão à 38 projetos para elaboração e execução de atividades socioeducativas formativas, assim como para pesquisa produção e publicação de trabalho.

As ações devem, principalmente, promover a dinamização, preservação e difusão da memória da população negra no Brasil. “Os Editais trabalham com a questão da presença negra para construção da sociedade brasileira, com foco na memória e na resistência dessa população.  São ainda um reforço para as ações em torno do 20 de novembro, uma importante conquista do Movimento Negro Brasileiro, e um reconhecimento à importância e referência da memória quilombola e de outros ícones das culturas negras no Brasil “, concluiu o presidente da FCP.

Incentivo- De acordo com Cobra, além de outros editais nos quais os produtores e as temáticas negras sejam contempladas, é imperativa a  necessidade de garantir mais incentivos para as artes e culturas negras. “O Brasil só tem a ganhar com a riqueza de abordagens cultural pautada na equidade na aplicação dos recurso e de expressão das criatividades” completa.

Jovens africanos trocam experiências sobre prevenção de DST

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Aline Valcarenghi
Repórter da Agência Brasil

Brasília - Estudantes africanos de Cabo Verde, que têm entre 14 e 16 anos, estão no Brasil para trocar experiências e informações sobre a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, principalmente a aids. Os oito jovens participaram no dia 29/09 de oficinas de break e grafite para conhecer as formas de expressão usadas pelos brasileiros.

Os jovens fazem parte do projeto Espaço de Informação e Orientação (EIO), desenvolvido em Cabo Verde, que oferece um espaço físico onde são discutidos temas relacionados à faixa etária deles, como orientação vocacional, sexualidade, drogas, álcool.

De acordo com a representante do Ministério da Educação de Cabo Verde, Suzana Delgado, que está acompanhando os estudantes, por meio do EIO são elaborados projetos e organizados eventos para divulgar informações sobre os temas de interesse para os demais colegas.

No Brasil, os africanos tiveram contato e trocaram experiências com os integrantes do Programa Jovens de Expressão, uma parceria entre o grupo Caixa Seguros e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), que tem o objetivo de reduzir a exposição de jovens entre 18 e 29 anos à violência e às doenças sexualmente transmissíveis.

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A estudante de Cabo Verde Cíntia Ramos, de 15 anos, disse que vai levar dessa experiência no Brasil novos meios de difundir a informação. "Aprendemos a fazer jornal mural, fanzines [revistas editadas por fãs] e a usar melhor as redes sociais. Meus amigos vão ficar loucos para aprender também. Vão ser novas formas de trabalhar os temas do EIO", contou a estudante.

Para os brasileiros, Cíntia disse que trouxe a experiência no EIO da sua escola. "É mais confortável falar com pessoas da nossa idade sobre os problemas que são iguais. Com os professores há uma questão de respeito, uma distância maior", explicou.

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Para Péricles Jeremias Borges, de 15 anos, além das oficinas o encontro está sendo produtivo porque está havendo uma intensa troca cultural. "Vou levar conhecimentos, mas também vou levar saudades dos brasileiros."

Os jovens chegaram a Brasília na última quinta-feira (26) para participar da Oficina Educomunicação e Educação em Sexualidade, uma parceria entre os governos do Brasil, de Cabo Verde e a Unesco. Na terça-feira (1º) eles participam de uma oficina sobre sexo seguro com a Rede de Jovens Vivendo com o HIV/aids. No início de 2014 os jovens brasileiros vão para Cabo Verde para um novo ciclo de intercâmbio.

Fonte: Agência Brasil/Geledes

sábado, 28 de setembro de 2013

Conceição Evaristo

Recordar é preciso
O mar vagueia onduloso sob os meus pensamentos
A memória bravia lança o leme:
Recordar é preciso.
O movimento vaivém nas águas-lembranças
dos meus marejados olhos transborda-me a vida,
salgando-me o rosto e o gosto.
Sou eternamente náufraga,
mas os fundos oceanos não me amedrontam
e nem me imobilizam.
Uma paixão profunda é a bóia que me emerge.
Sei que o mistério subsiste além das águas.
Eu-Mulher
Uma gota de leite
me escorre entre os seios.
Uma mancha de sangue
me enfeita entre as pernas.
Meia palavra mordida
me foge da boca.
Vagos desejos insinuam esperanças.
Eu-mulher em rios vermelhos
inauguro a vida.
Em baixa voz
violento os tímpanos do mundo.
Antevejo.
Antecipo.
Antes-vivo
Antes – agora – o que há de vir.
Eu fêmea-matriz.
Eu força-motriz.
Eu-mulher
abrigo da semente
moto-contínuo
do mundo.
Conceição Evaristo. Poemas da recordação e outros movimentos. Belo Horizonte: Nandyala, 2008.

Portugal diz que Moçambique é exemplo de democracia adulta em África



Moçambique deve prosseguir na senda de expansão.

Para o ministro português dos Negócios Estrangeiros, o país africano deve prosseguir na senda de expansão; chefe da diplomacia revela oportunidades de trocas comerciais e de investimentos bilaterais.
O ministro português dos Negócios Estrangeiros elogiou o estágio da democracia em Moçambique, num período em que o país africano está em expansão.
Em entrevista à Rádio ONU, Rui Machete revelou o interesse comum em trocas comerciais.
Exemplo
"Nós começamos, e os moçambicanos também, as oportunidades que existem para as empresas em termos de trocas comerciais mas também em termos de investimento. Nós pensamos que é importante para o país neste período de expansão, que continue na senda que tem vindo a seguir e que é um exemplo para muitos países africanos no estabelecimento de uma de democracia cada vez mais adulta e mais estabilizada."
Como propostas, sugeriu a colaboração portuguesa com infraestruturas, construção de estradas e portos além do contributo em questões de exploração mineira e do gás. Mas falou de desafios enfrentados por Moçambique.
Problemas
"É importante que se ultrapassem pequenos problemas que sempre surgem nessas ocasiões, e tudo leva a crer que não terão nenhum significado particular. Depois, que haja as condições adequadas para que os investimentos se possam processar normalmente, tanto no que diz respeito aos investimentos portugueses em Moçambique, como os investimentos moçambicanos em Portugal, embora esses sejam comparativamente menores que os investimentos angolanos."
Em Nova Iorque, o governante participa em eventos realizados no âmbito da Assembleia Geral das Nações Unidas, que devem culminar com um discurso na plenária, neste sábado.
Eleutério Guevane, da Rádio ONU em Nova Iorque.

Inscrições abertas para Edital Novembro Negro

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Interessados em participar da 7ª edição do Edital Novembro Negro podem se inscrever até o dia 18 de outubro. A informação foi divulgada nesta quarta-feira (25), data em que as inscrições foram abertas, pela assessoria da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi).
De acordo com o órgão estadual, o objetivo é selecionar e apoiar financeiramente 20 projetos que promovam visibilidade ao mês da Consciência Negra e tratem da temática étnico-racial. Os recursos são de R$ 400 mil.
O edital foi criado há sete anos, segundo a Sepromi, com o propósito de fortalecer ações de promoção da igualdade racial no mês de novembro, instituído como o mês da Consciência Negra, quando se celebra a memória e o legado de Zumbi dos Palmares.
Em 2013, o edital tem como temática a Promoção da Igualdade Racial e Defesa de Direitos da População Negra. Serão contemplados projetos nas modalidades: Apresentações Públicas e Manifestações Culturais; Formação; e Registro e Memória.
Na modalidade Apresentações Públicas e Manifestações Culturais, seis projetos serão selecionados no valor de até R$ 20 mil. As atividades podem ser: concursos com competições entre categorias profissionais e desportivas na área de artes, cultura e ciência; caminhadas e marchas para mobilizar a população; apresentações teatrais, festivais culturais e saraus de dança, poesia, literatura, música, teatro, pintura e escultura.
Na modalidade Formação, nove projetos vão ser contemplados com o apoio de até R$ 15 mil. As entidades selecionadas poderão realizar seminários, oficinas e cursos para debater, praticar e tentar encontrar soluções que viabilizem o tema proposto.
Em Registro e Memória, cinco projetos vão ser selecionados no valor de até R$ 29 mil. No segmento, as entidades poderão produzir documentários, CDs com áudio, exposição temática e publicação de cartilhas.
Os interessados devem se inscrever na sede da Sepromi ou postar via correios até a data limite. Consulte o edital completo e maiores informações no link: http://bit.ly/16FxsfY

Fonte: CorreioNagô 

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

86 ANOS DE NOÉMIA DE SOUSA: "Se me quiseres conhecer "




Se me quiseres conhecer,
estuda com olhos bem de ver
esse pedaço de pau preto
que um desconhecido irmão maconde
de mãos inspiradas
talhou e trabalhou
em terras distantes lá do Norte.

Ah, essa sou eu:
órbitas vazias no desespero de possuir vida,
boca rasgada em feridas de angústia,
mãos enormes, espalmadas,
erguendo-se em jeito de quem implora e ameaça,
corpo tatuado de feridas visíveis e invisíveis
pelos chicotes da escravatura...
Torturada e magnífica,
altiva e mística,
África da cabeça aos pés,
- ah, essa sou eu

Se quiseres compreender-me
vem debruçar-te sobre minha alma de África,
nos gemidos dos negros no cais
nos batuques frenéticos dos muchopes
na rebeldia dos machanganas
na estranha melancolia se evolando
duma canção nativa, noite dentro...

E nada mais perguntes,
se é que me queres conhecer...
Que não sou mais que um búzio de carne,
onde a revolta de África congelou
seu grito inchado de esperança.



Escritora moçambicana, Carolina Noémia Abranches de Sousa Soares nasceu a 20 de Setembro de 1926, em Lourenço Marques (hoje Maputo), Moçambique. O seu trabalho poético continua por publicar em livro. Poetiza que, numa espécie de postura predestinada, desembaraçando-se das normas tradicionais europeias, de 1949 a 1952 escreve dezenas de poemas, estando muitos deles dispersos pela imprensa moçambicana e estrangeira.
Com apenas 22 anos de idade, surge na senda literária moçambicana num impulso encantatório, gritando o seu verbo impetuoso, objectivo e generoso, vincado (bem fundo) na alma do seu povo, da sua cultura, da sua consciência social, revelando um talento invulgar e uma coragem impressionante.
Toda a sua produção é marcada pela presença constante das raízes profundamente africanas, abrindo os caminhos da exaltação da Mãe-África, da glorificação dos valores africanos, do protesto e da denúncia.
Poesia de forte impacto social, acusatória, a sua linguagem recorre estilisticamente à ressonância verbal, ao encadeamento de significantes sonoros ásperos, à utilização de palavras que transportam o “grito inchado” de esperança.
Noémia de Sousa, como autêntica pioneira da Literatura Moçambicana (como assim sempre foi considerada) preconiza - no seu percurso literário - a revolução como único meio de modificar as estruturas sociais que assolam a terra moçambicana.
Nos seus poemas, o “eu” de Noémia de Sousa é entendido como um “colectivo”, um povo inteiro que quer ter palavra - o povo moçambicano. Desta forma, a poetiza assume-se como porta-voz daquele povo que é o seu e, dirigindo-se à terra-mãe que os acolhe e protege, ora canta a sua vida, ora lhe pede perdão pela alienação demonstrada ao longo de tanto tempo, ora (mesmo) lhe promete a rápida e definitiva devolução do seu direito a uma vida própria, autêntica.

Guiné-Bissau espera ajuda do Brasil para eleições de novembro



Declaração foi feita em entrevista à Rádio ONU pelo presidente de transição do país africano de língua portuguesa, Manuel Serifo Nhamadjo; líder guineense teme que posição coletiva da Cplp impeça auxílio brasileiro.

O presidente de transição da Guiné-Bissau afirmou à Rádio ONU que seu país está contando com a ajuda do Brasil para a realização das eleições gerais, marcadas inicialmente para 24 de novembro.
Em entrevista exclusiva à Rádio ONU, pouco antes de discursar na Assembleia Geral, o presidente Manuel Serifo Nhamadjo elogiou o apoio que o Brasil tem dado a seu país, há vários anos, mas disse que receia mudanças por causa da situação política gerada com o golpe de 12 de abril na Guiné.
Participação
Ao ser perguntado se a tecnologia do sistema de urnas eletrônicas no Brasil poderia ajudar à Guiné, o presidente respondeu:
"Sim, o Brasil poderia ajudar bastante. Só que o presidente Ramos Horta esteve lá, eu não sei o que é que se evoluiu e acredito que também que dentro desta comunidade Cplp, da posição que tem em relação aos acontecimentos de 12 (de abril) poderá contribuir para esse recuo na participação do Brasil. Não sei, não sei…"
Há vários anos, o Brasil lidera a estratégia de paz para a Guiné-Bissau na Comissão de Consolidação da Paz das Nações Unidas. O país também realiza ações de apoio ao desenvolvimento no contexto da Cooperação Sul-Sul.
Relações
O presidente da Guiné-Bissau lembrou ainda das relações de seu país com outras nações lusófonas dentro da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
"E nisso reconhece que o Brasil foi sempre um país que ficou em dar apoio e certamente continuará, assim como os outros. Aliás, Cabo Verde é um país de relações históricas muito sólidas, não são esses pequenos incidentes que vão criar problemas ou que vão pôr em causa essa nossa relação histórica e com São Tomé, a mesma coisa. E falando de São Tomé, fala-se de Angola, de Moçambique, são todos países irmãos e nós temos uma cumplicidade histórica, que é impensável dizer que teremos problemas de maior. Há um incidente, que deve ser analisado e situá-lo no seu momento, no seu contexto, para que depois das eleições, o país se reencontre, todos esses países irmãos, para o desenvolvimento que todos desejamos."
Ordem Constitucional
Ao retornar à tribuna da Assembleia Geral, após dois anos sem discursar na casa, o presidente da Guiné-Bissau pediu o apoio de todos os países da ONU para restaurar a ordem constitucional na Guiné.
"Aguarda simplesmente o apoio internacional para que possamos iniciar o recenseamento sem o qual as eleições não poderão ter lugar. Portanto é importante, é imperativo que a comunidade internacional nos apoie na realização, no recenseamento fiável para que as eleições possam ocorrer num ambiente de tranquilidade."
O Escritório das Nações Unidas na Guiné-Bissau, Uniogbis, que é liderado pelo ex-presidente do Timor-Leste, José Ramos Horta, está trabalhando junto com autoridades guineenses no apoio da realização das eleições.
Segundo Ramos Horta, vários doadores internacionais estão à espera de um protocolo claro sobre a realização do pleito para que possam fazer suas promessas de doação financeira.
Mônica Villela Grayley, da Rádio ONU em Nova York.

Guebuza: "Cplp muito longe de integração económica"


Armando Guebuza. Foto: ONU//Paulo Filgueiras


Presidente moçambicano defende que condição é uma maior união regional de Portugal, do Brasil e das nações africanas lusófonas nas suas próprias regiões.

O presidente moçambicano disse que uma integração regional dos membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, Cplp, depende da união dos seus integrantes dentro das próprias regiões.
Armando Guebuza respondia a uma questão da Rádio ONU, em Nova Iorque, sobre as perspetivas de uma aliança económica do bloco de oito nações,  no qual Moçambique assume liderança rotativa.
Reforço
"Estamos muito distantes, em termos económicos, para falar de integração económica. A via para a integração económica na Cplp pode ser manifestada através do reforço de Portugal na Europa porque está lá, o reforço o Brasil por via de Mercosul, onde está. No nosso caso,  acelerarmos os processos de integração continental e, já fazemos  isso através dos processos de integração regional que já estão em curso e estão a avançar no nosso continente.
No ano passado, a Cplp aprovou uma estratégia de luta contra a fome no bloco em parceria com Fundo da ONU para Agricultura e Alimentação, FAO. O Objetivo é aliviar aos mais de 28 milhões de pessoas afetadas pela carência alimentar e pela pobreza nos países-membros.
O Fórum Macau, um grupo que detém relações de cooperação com países de língua portuguesa, movimentou US$ 117 mil milhões no comércio com os integrantes da Cplp em 2011 e 2012.
Eleutério Guevane, da Rádio ONU em Nova Iorque.

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Estética e moda negra brasileira são tema de seminários em BH

Acervo FCP

Capital mineira recebe evento que vai mapear a cadeia produtiva do setor no país e refletir sobre a relação com economia criativa e a estética negra
Pegue um grande pote de barro e adicione pedras, sementes, madeira, verdadeiras esculturas feita com cabelos e toda a riqueza visual das tribos africanas. Misture tudo, acrescente doses generosas de cores vibrantes, palhas, búzios e respeito pelo sagrado. Tempere com doses de ritmo e alegria, e leve para assar em forno pré-aquecido pelo sol que brinda a Mãe-África.
O resultado dessa receita é a moda negra brasileira, que nos brinda com vestidos, túnicas, calças, macacões, turbantes e saias que mais do que vestir o corpo, expressam a afirmação e a valorização das culturas e identidades africanas presentes no Brasil.
Para refletir sobre essa temática,a Fundação Cultural Palmares – MinC (FCP), em parceria com a Associação Nacional da Moda Afro-Brasileira (ANAMAB) e a Prefeitura de Belo Horizonte, por meio da Fundação Municipal de Cultura, realiza nos dias 24 e 25 de outubro, em Belo Horizonte/MG, o I Seminário – Moda, Estética Negra e Economia Criativa, que pretende também debater o mercado brasileiro de moda afro e a sua relação com a economia criativa e a estética negra.
De acordo com Lindivaldo Júnior, diretor do Departamento de Fomento e Promoção da Cultura Afro-brasileira da FCP – MinC, a ideia de realizar o seminário surgiu a partir de uma demanda das produtoras de moda que sentiam há algum tempo a necessidade de se discutir a situação do mercado brasileiro da moda afro. Ainda segundo ele, o evento que acontece dentro da programação do Festival de Arte Negra – FAN-BH, é mais uma forma de subsidiar a construção de uma Política Nacional de Cultura Afro-brasileira.
“Embora existam algumas ações, em âmbito federal, que contemplem a cultura afro-brasileira, nós precisamos de uma política estruturada que atenda as necessidades da população”, afirma. “O conjunto de debates que a FCP tem realizado nas comemorações dos seus 25 anos são também uma forma de reunir materiais que vão contribuir para a construção dessa Política. A moda, que é uma das formas de expressar e representar a nossa cultura, também precisa subsidiar essa caminhada”, pontuou.
Mapeamento – Seminário – Moda, Estética Negra e Economia Criativa também será uma oportunidade para realizar um mapeamento inédito no Brasil, que vai revelar o número de ateliês e estilistas de moda afro-brasileira e qual é a realidade desses produtores.
A Makota Kizandembu Kiamaza, uma das coordenadoras da ANAMAB, ressalta que a partir do mapeamento, será possível identificar a cadeia produtiva da moda afro-brasileira e quais posições são ocupadas. “A partir daí, vamos discutir porque a nossa moda não tem visibilidade no Brasil”, declara. “Quando se fala que a moda brasileira movimenta cerca de 30% da economia, é importante questionar porque as produtoras de moda afro não estão inseridas nesse contexto”, alerta a Makota.
Para participar do evento, que vai debater ainda sobre desenvolvimento sustentável e empreendorismo, os interessados devem acessar a ficha de inscrição preencher o formulário e enviar para os e-mails: 25anospalmares@palmares.gov.br e makotafan2013@noderosa.com.br. As vagas são limitadas.
Confira a programação completa do Seminário:
PROGRAMAÇÃO
Homenageadas: Makota Subukenã Kiamaza- MG e Maria do Carmo Valerio (Muene-SP)
24 de Outubro (Quinta-feira)
15h às 18h–Credenciamento
18h – Solenidade de Abertura com autoridades local e nacional
19h – Palestra “Desafios para uma política nacional para a cultura negra”
20h – Coquetel e Apresentação artística
21h - Festa da Moda (Espaço Cultural 104)
25 de Outubro (sexta-feira)
Painéis temáticos
8h às 12h – Painel – História da Moda Afro-Brasileira e o Simbólico:
12h30 às 13h30– Almoço
14h às 16h– Mesa Redonda – Economia Criativa e Desenvolvimento Sustentável
16h30 às 18h30 – Painel – Inserção da Moda Afro-brasileira no Mercado

SOLANO TRINDADE




Nasceu no dia 24 de julho de 1908, no bairro de São José, no Recife (PE). Além de poeta, foi pintor, teatrólogo, ator e folclorista. Legítimo poeta da resistência negra por excelência. Em 1930, começa a compor poemas afro-brasileiros. Em1934, participa do I e do II Congresso Afro-Brasileiro, no Recife e Salvador. Em 1936, fundou a Frente Negra Pernambucana e o Centro de Cultura Afro-brasileiro, para divulgação dos intelectuais e artistas negros. Em 1940, transfere-se para Belo Horizonte. Depois chega ao Rio Grande do Sul, fixando-se por um tempo em Pelotas, onde funda com o poeta Balduíno de Oliveira um grupo de arte popular, que não foi avante por causa das enchentes.

Retornou ao Recife em 1941, mas logo foi para o Rio de Janeiro, onde faz sucesso no "Café Vermelhinho". Em 1945, funda o Comitê Democrático Afro-brasileiro, com Raimundo Souza Dantas, Aladir Custódio e Corsino de Brito. Em 1954, está em São Paulo, criando na cidade de Embu, um pólo de cultura e tradições afro-americanas. Em São Paulo também funda o Teatro Popular Brasileiro – TPB, onde desenvolveu intensa atividade cultural voltada para o folclore e para a denúncia do racismo. Em 1955, viaja para a Europa, com o TPB, onde dá espetáculos de canto e dança. Faleceu no Rio de janeiro, em 19 de fevereiro de 1974. 

Tem gente com fome

Trem sujo da Leopoldina 
correndo correndo 
pra dizer 
tem gente com fome 
tem gente com fome 
tem gente com fome 

Piiiii 

estação de Caxias 
de novo a dizer 
de novo a correr 
tem gente com fome 
tem gente com fome 
tem gente com fome 
Vigário Geral 
Lucas 
Cordovil 
Brás de Pina 
Penha Circular 
Estação da Penha 
Olaria 
Ramos 
Bom Sucesso 
Carlos Chagas 
Triagem, Mauá 
trem sujo da Leopoldina 
correndo correndo 
parece dizer 
tem gente com fome 
tem gente com fome 
tem gente com fome 
Tantas caras tristes 
querendo chegar 
em algum destino 
em algum lugar 

Trem sujo da Leopoldina 
correndo correndo 
parece dizer 
tem gente com fome 
tem gente com fome 
tem gente com fome 

Só nas estações 
quando vai parando 
lentamente começa a dizer 
se tem gente com fome 
dá de comer 
se tem gente com fome 
dá de comer 
se tem gente com fome 
dá de comer 
Mas o freio do ar 
todo autoritário 
manda o trem calar 
Psiuuuuuuuuuu


Sou Negro

Sou negro 
meus avós foram queimados 
pelo sol da África 
minh`alma recebeu o batismo dos tambores 
atabaques, gongôs e agogôs 
Contaram-me que meus avós 
vieram de Loanda 
como mercadoria de baixo preço 
plantaram cana pro senhor de engenho novo 
e fundaram o primeiro Maracatu 

Depois meu avô brigou como um danado 
nas terras de Zumbi 
Era valente como quê 
Na capoeira ou na faca 
escreveu não leu 
o pau comeu 
Não foi um pai João 
humilde e manso 
Mesmo vovó 
não foi de brincadeira 
Na guerra dos Malês 
ela se destacou 

Na minh`alma ficou 
o samba 
o batuque 
o bamboleio 
e o desejo de libertação


Canta América

Não o canto de mentira e falsidade
que a ilusão ariana
cantou para o mundo
na conquista do ouro
nem o canto da supremacia dos derramadores de sangue
das utópicas novas ordens
de napoleônicas conquistas
mas o canto da liberdade dos povos
e do direito do trabalhador...


CONVERSA

- Eita negro!
quem foi que disse
que a gente não é gente?
quem foi esse demente,
se tem olhos não vê...

- Que foi que fizeste mano
pra tanto falar assim?
- Plantei os canaviais do nordeste

- E tu, mano, o que fizeste?
Eu plantei algodão
nos campos do sul
pros homens de sangue azul
que pagavam o meu trabalho
com surra de cipó-pau.

- Basta, mano,
pra eu não chorar,
E tu, Ana,
Conta-me tua vida,
Na senzala, no terreiro

- Eu...
cantei embolada,
pra sinhá dormir,
fiz tranças nela,
pra sinhá sair,
tomando cachaça,
servi de amor,
dancei no terreiro,
pra sinhozinho,
apanhei surras grandes,
sem mal eu fazer.

Eita! quanta coisa
tu tens pra contar...
não conta mais nada,
pra eu não chorar -

E tu, Manoel,
que andaste a fazer
- Eu sempre fui malandro
Ó tia Maria,
gostava de terreiro,
como ninguém,
subi para o morro,
fiz sambas bonitos,
conquistei as mulatas
bonitas de lá...

Eita negro!
- Quem foi que disse
que a gente não é gente?
Quem foi esse demente,
se tem olhos não vê.


Eu gosto de ler gostando

Eu gosto de ler gostando,
gozando a poesia,
como se ela fosse
uma boa camarada,
dessas que beijam a gente
gostando de ser beijada.

Eu gosto de ler gostando
gozando assim o poema,
como se ele fosse
boca de mulher pura
simples boa libertada
boca de mulher que pensa...
dessas que a gente gosta
gostando de ser gostada.


Olorum ÈKE

Olorum Ekê
Olorum Ekê
Eu sou poeta do povo
Olorum Ekê

A minha bandeira
É de cor de sangue
Olorum Ekê
Olorum Ekê
Da cor da revolução
Olorum Ekê

Meus avós foram escravos
Olorum Ekê
Olorum Ekê
Eu ainda escravo sou
Olorum Ekê
Olorum Ekê
Os meus filhos não serão
Olorum Ekê
Olorum Ekê


Inscrições abertas para Edital Novembro Negro



 Interessados em participar da 7ª edição do Edital Novembro Negro podem se inscrever até o dia 18 de outubro. A informação foi divulgada nesta quarta-feira (25), data em que as inscrições foram abertas, pela assessoria da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi).
De acordo com o órgão estadual, o objetivo é selecionar e apoiar financeiramente 20 projetos que promovam visibilidade ao mês da Consciência Negra e tratem da temática étnico-racial. Os recursos são de R$ 400 mil.
O edital foi criado há sete anos, segundo a Sepromi, com o propósito de fortalecer ações de promoção da igualdade racial no mês de novembro, instituído como o mês da Consciência Negra, quando se celebra a memória e o legado de Zumbi dos Palmares.
Em 2013, o edital tem como temática a Promoção da Igualdade Racial e Defesa de Direitos da População Negra. Serão contemplados projetos nas modalidades: Apresentações Públicas e Manifestações Culturais; Formação; e Registro e Memória.
Na modalidade Apresentações Públicas e Manifestações Culturais, seis projetos serão selecionados no valor de até R$ 20 mil. As atividades podem ser: concursos com competições entre categorias profissionais e desportivas na área de artes, cultura e ciência; caminhadas e marchas para mobilizar a população; apresentações teatrais, festivais culturais e saraus de dança, poesia, literatura, música, teatro, pintura e escultura.
Na modalidade Formação, nove projetos vão ser contemplados com o apoio de até R$ 15 mil. As entidades selecionadas poderão realizar seminários, oficinas e cursos para debater, praticar e tentar encontrar soluções que viabilizem o tema proposto.
Em Registro e Memória, cinco projetos vão ser selecionados no valor de até R$ 29 mil. No segmento, as entidades poderão produzir documentários, CDs com áudio, exposição temática e publicação de cartilhas.
Os interessados devem se inscrever na sede da Sepromi ou postar via correios até a data limite. Consulte o edital completo e maiores informações no link: http://bit.ly/16FxsfY
Fonte: correio nagô

Sétima edição da Primavera dos Museus destaca relação entre memória e cultura afro-brasileira

A sétima edição da Primavera dos Museus começou nesta segunda-feira (23) em todo o país, com o tema Museus, Memórias e Cultura Afro-Brasileira. Até domingo (29), museus em diversas cidades terão programação especial que inclui palestras, oficinas, exposições com visitas guiadas, além de concertos musicais e apresentações de dança. No Brasil, 884 museus vão promover 2.264 eventos culturais, propondo ao público uma reflexão mais profunda sobre o tema. Só no estado do Rio, participam 82 unidades.

O evento é uma iniciativa do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). A temática deste ano é resultado de uma discussão sobre a transformação social apresentada durante a conferência do Comitê Internacional de Museus de 2013, que abordou a junção de memória e criatividade resultando em mudança social. Assessor cultural do Museu da República, uma das unidades do Ibram, o museólogo Mário Chagas diz ser impossível falar em qualquer mudança social no Brasil sem tratar a questão da cultura afro-brasileira.

“Estamos articulando museus, memórias e cultura afro-brasileira, no sentido de que a memória pode contribuir para uma maior emancipação da cultura brasileira”, destaca. “Vivemos em um país onde a intolerância religiosa continua e é crescente, onde as práticas racistas são recorrentes, tem uma potência no que se refere à cultura afro-brasileira, no entanto frequentemente desvaloriza essa cultura”, acrescenta.

No Rio, entre as instituições participantes da Primavera dos Museus estão o Museu Histórico Nacional, o Museu Imperial, em Petrópolis, região serrana do estado, e o Museu Nacional de Belas Artes, que promove na quarta-feira (25) uma palestra sobre a arte africana.

O Museu da República abriu hoje para o público três exposições e mesas-redondas sobre cultura afro-brasileira e intolerância religiosa. Na visão do museólogo, o impacto causado pelo evento é muito forte no setor cultural e social. “Isso contribui para as pessoas que trabalham no museu, contribui para o nosso setor educativo, mas também contribui para o público. Discutimos os problemas sociais, a questão da violência contra as mulheres, o tema da liberdade religiosa e mulheres negras em vários segmentos da sociedade. A Primavera dos Museus é uma espécie de convite a uma reflexão complexa”, ressalta Mário Chagas.

Desde a primeira edição em 2007, a Primavera dos Museus vem ganhando mais adeptos. Em 2007, 300 museus aderiram ao evento, com 874 atividades em todo o país. Agora, 884 participam. A programação completa está disponível no site http://www.museus.gov.br.

Fonte: Portal EBC

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Poetisas negras: gênero e etnia através dos versos

Para começo de conversa, quantas escritoras negras vocês conhecem? Quantas vocês já estudaram ao longo da formação escolar? Quantos livros de poetisas negras vocês encontram por aí nas livrarias? Pois é, tenho certeza que a grande maioria das pessoas que começaram a ler este texto deve ter dito um “NÃO” para a maioria das questões acima, sobretudo à segunda. Desde muito cedo sempre fiquei me questionando o porquê de estudar uma infinidade de autores, majoritariamente brancos e homens.
Quando estudava alguma autora e ficava feliz da vida, era uma por semestre, e nenhuma delas era negra. Ficava indignada ao pegar os livros didáticos e observar que em nenhum momento a literatura de autoria negra fazia parte dali, e se fazia, era só um pequeno resumo, sobre a obra de um homem (Cruz e Sousa, um Machado de Assis que há algum tempo o deixaram branco num comercial de TV), mas jamais aprendi em âmbito escolar que havia escritoras negras.
É muito importante que se trave uma luta para a visibilidade da literatura negra e os livros didáticos não devem ficar de fora, pois na escola se formam ideologias, e o trabalho, sobretudo da literatura que trabalhe questões raciais, este é mais um passo para que a discriminação racial não continue fincando suas raízes no processo educacional e social. Ao contrario do que muita gente (infelizmente) ainda pensa, a poesia possui papel fundamental para transformações sociais, do meu ponto de vista, político e revolucionário.
Hoje diversos eventos de trabalho com a poesia, principalmente na periferia são atividades constantes, com saraus, teatro e tenham ganhado tanto espaço, formando leitores e autores engajados em discutir raça, classe e gênero em sua construção poética. A cada dia que passa a poesia se faz mais presente nas lutas contra as opressões.
A escravidão traz marcas até hoje, cicatrizes profundas carregadas pelos negros, sobretudo as mulheres negras, oprimidas tanto pelo seu gênero, quanto por sua cor. A todo custo nos é ensinado a negar a nossa identidade, fazendo assim com que desprezemos a nossa origem, querendo encaixar nos padrões de beleza europeus, com a febre por cabelos lisos; outro retrato fiel de herança na escravidão é o mercado de trabalho para a mulher negra; no que se refere à educação, ainda somos minoria no ensino público superior.
Permanecemos construídas como seres que servem para enfeitar cartão postal e ser atração pra turista; representam-nos nas novelas, filmes e comerciais como meros produtos nacionais; o machismo inventa desculpas para camuflar o machismo, falando das formas corporais da mulher negra, criando estereótipos para que nos esqueçamos da história de opressão; somos as mais atingidas pela miséria; aproveitando as dores causadas pela opressão, tentaram apagar a nossa identidade e fazer com que a resistência fosse esquecida.
Algumas das minhas citações acima são opressões enfrentadas comumente pelo gênero feminino, todavia é necessário fazer um recorte na discussão de gênero para discutir a opressão à mulher negra (oprimida duas vezes). Do meu ponto de vista, não podemos discutir as opressões como se as questões sociais fossem tudo uma coisa só, deve ser levada em consideração os agravantes de opressão para luta a discussão, como raça, gênero, classe social e orientação sexual.
Elisa Lucinda, escritora brasileira.
Elisa Lucinda, escritora brasileira. Imagem: reprodução.
A divulgação da poesia negra em nosso país começou a ser feita há pouquíssimo tempo (meados da década de 70), e a cada dia nossa luta também no campo da literatura ganha força e através da poesia, vamos executando nosso grito por igualdade, discutindo as mazelas sociais, os resquícios de uma sociedade escravocrata, assumimos a nossa identidade, escrevendo a nossa história, direitos que por muitos anos foram negados. Os estudos acerca da poesia de autoria negra e feminina ainda são poucos, sinto na pele a dificuldade em levar esta discussão ao meio acadêmico que é tradicional, trabalhando a poesia de autores brancos e homens, um meio muitas vezes fechado para discutir uma história que vem sendo escrita há tempos.
A representação do negro na literatura e nos livros didáticos é produto da opressão racial que se arrasta na sociedade, a mulher negra na literatura historicamente foi construída trabalhada em estereótipos, e escrita/descrita por outras pessoas, nunca por elas mesmas, quando o assunto é poesia são poucos os registros de poesias sobre a mulher negra e escritas por mulheres negras, até mesmo nos dias de hoje. Isso não significa que não tenhamos poesia de autoria feminina e negra que discuta gênero e etnicidade, significa que a falta de divulgação e o meio literário preso às tradições, não abre espaço para o novo, não abriu espaço, mesmo com tantos anos de contribuições negras literárias, para que possamos expor a nossa história e fazer parte da literatura nacional.
O que faltava para o mundo da poesia negra era visibilidade, nossa voz através dos versos, era preciso discutir raça e gênero, assim reafirmando nossa etnia, discutindo as opressões contra as quais lutamos todos os dias. Na trajetória em busca de atrás das obras de escritoras negras, acabei conhecendo um pouco da obra de Conceição Evaristo, Elisa Lucinda, Carolina Maria de Jesus, Esmeralda Ribeiro, Cristiane Sobral, entre outras. Com sede de poesia, com sede de lutar através dos versos, eis que me apaixonei pela obra de Cristiane Sobral e Elisa Lucinda, que possuem vários pontos comuns, tratam-se de duas escritoras contemporâneas que expressam na poesia a voz da mulher negra, a ancestralidade, lutam contra o racismo e discutem gênero.
O meu primeiro contato foi com Elisa Lucinda, pela poesia além da forma, em cada palavra um impulso para a luta, um grito e exposição de tudo que a mulher negra herdou da escravidão, um quadro social muito além dos versos, o sentimento de luta começou a sair pelos meus olhos quando li:
“Em mim tu esqueces tarefas, favelas, senzalas, nada mais vai doer.
Sinto cheiro docê, meu maculelê, vem nega, me ama, me colore
Vem ser meu folclore, vem ser minha tese sobre nego malê.
Vem, nega, vem me arrasar, depois te levo pra gente sambar.”
Imaginem: Ouvi tudo isso sem calma e sem dor.
Já preso esse ex-feitor, eu disse: “Seu delegado…”
E o delegado piscou.
Falei com o juiz, o juiz se insinuou e decretou pequena pena
com cela especial por ser esse branco intelectual…
Eu disse: “Seu Juiz, não adianta! Opressão, Barbaridade, Genocídio
nada disso se cura trepando com uma escura!”- Mulata Exportação (Da série “Brasil, meu espartilho”)
A autora expõe a visão machista e a construção social feita em torno da imagem da mulher negra, herança da escravidão e reforçada na literatura, novelas e filmes, com base na idéia da mulher negra como objeto sexual. O contato com Cristiane Sobral se deu por meio de um evento poético, onde tive um contato maior com a literatura marginal (outro assunto do meu interesse) e em meio à noite poética, eis que surgem algumas mulheres que começam a declamar uma poesia forte, a literatura feminina afro-brasileira, um protesto, o eu-lírico gritando: “Não Vou Mais Lavar os Pratos!”, eis um trecho:
“Não vou limpar a poeira dos móveis
Sinto muito. Comecei a ler
Abri outro dia um livro e uma semana depois decidi
Não levo mais o lixo para a lixeira
Nem arrumo a bagunça das folhas que caem no quintal
Sinto muito. Depois de ler percebi a estética dos pratos
A estética dos traços, a ética
A estática
Olho minhas mãos quando mudam a página dos livros
Mãos bem mais macias que antes
e sinto que posso começar a ser a todo instante” Sobral. Cristiane. Não vou mais lavar os pratos
A luta negra e feminista está presente e mais viva do que nunca na poesia. Através dos versos reafirmamos a nossa identidade e utilizamos à escrita como meio de discutir e lutar contra as opressões da sociedade racista, classista e patriarcal. Temos um caminho muito longo a percorrer por uma sociedade mais igual, onde a mulher negra possa escrever a sua própria história, prosa, poesia e liberdade. Estamos cansadas dos retratos de escravas, de escreverem por nós as nossas angústias, nas nossas lutas e nossas vozes parecendo ser através das letras que não veio das mãos de quem de fato enfrenta todos os dias o julgamento, o tapa da desigualdade, o deboche pela sua cor, o seu cabelo querendo ser camuflado, as cicatrizes da privação de direitos e liberdade, o grito da ancestralidade e luta e orgulho de ser mulher, negra, guerreira e poeta.
Luma Oliveira

Mulheres Pretas

    Conversar com a atriz Ruth de Souza era como viver a ancestralidade. Sinto o mesmo com Zezé Motta. Sua fala, imortalizada no filme “Xica...