segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Essa é a mistura do Brasil com o Egito: múmia passeia por shopping na Barra

Essa é a mistura da Brasil com o Egito - Sha-amun-en-su - ilustração livre que reproduz a múmia Sha-Amun com base em fotografias e nos desenhos do egiptólogo Antonio Brancaglion#serafina91


Ilustração livre que reproduz a múmia Sha-Amun com base em fotografias e nos desenhos do egiptólogo Antonio Brancaglion



Aos 2.800 anos e com um corpinho que não aparenta mais do que apenas alguns séculos, Sha-Amun-En-Su é a diva que você quer copiar.

Sucesso em Tebas há quase três milênios como cantora solista do templo de Amon, Sha-Amun convivia com o faraó em pessoa, e não passava despercebida pelas ruas da capital do Egito antigo.

Hoje em nova roupagem, com bandagens de linho, resina no crânio, enchimentos na garganta e devidamente eviscerada —"uma mumificação top de linha", segundo o egiptólogo Antonio Brancaglion Junior—, a ex-cantora faz sucesso como estrela da coleção egípcia do Museu Nacional, no Rio de Janeiro.

Sha-Amun já era uma relíquia quando os portugueses aqui chegaram. Isso não a impediu, no entanto, de desfrutar das intimidades do poder em terras tupiniquins. Oferecida como presente diplomático ao imperador dom Pedro 2º durante uma viagem ao Egito, a múmia foi trazida ao país em 1872, e passou seus primeiros anos nos trópicos no abrigo do gabinete do monarca.

Diz-se, inclusive, que o governante se "aconselhava" com a egípcia. Sua carreira na política, contudo, não foi das mais longevas. Dezessete anos depois de sua chegada ao Rio, a República foi instaurada. D. Pedro 2º foi deposto, exilado e nunca mais viu sua companheira de gabinete, que, ao contrário da família real, não arredou pé da Quinta da Boa Vista, que hoje abriga o Museu Nacional.

Com o novo regime, a cantora transformada em múmia finalmente passou a se apresentar novamente ao público.

Mas apenas em partes. Isso porque, até hoje, o corpo de Sha-Amun nunca deixou o caixão. Ela é uma das poucas múmias do mundo nunca abertas, conta Brancaglion, responsável pela coleção egípcia do Museu Nacional.

Em seguida, o egiptólogo enumera algumas das mil e uma utilidades de uma múmia fora de seu caixão. "Na Inglaterra, cobravam-se ingressos para que as pessoas fossem ao teatro observar a abertura das múmias."

E continua: "Os ricos e famosos do período vitoriano também eram fascinados pelo pó de múmia. A rainha Vitória costumava cheirá-lo para combater a artrite. Pedaços dos corpos, como mãos, pés e cabeças, eram vendidos aos turistas. Conta-se até que as locomotivas egípcias usavam múmias em vez de lenha nas fornalhas. Era matéria-prima para eles".

O pó de múmia, caso o leitor esteja curioso, é isso mesmo: múmia moída para inalar. Sortuda, Sha-Amun escapou incólume das locomotivas, dos narizes e dos vendedores de cacarecos ao longo de seu além-vida.

Algumas pragas egípcias, contudo, como cupins e vespas, além de uma janela do gabinete de d. Pedro 2º (que se chocou contra a lateral do esquife, quebrando-o), trataram de castigar o caixão. "Se alguém tentar abri-lo, ele certamente será destruído", afirma Brancaglion.

Se depender da equipe do Museu Nacional, a previsão para Sha-Amun é de mais algumas boas décadas sem se expor à luz do sol. "Quem tem múmia tem, quem não tem não vai ter mais. Se a perdermos, jamais conseguiremos outra coisa remotamente parecida. Temos que conservá-la ao máximo". Para isso, a múmia precisa passear de vez em quando. Em 2008, por exemplo, Sha-Amun deu uma volta por um shopping na Barra. Devidamente acompanhada, é claro.

É que a equipe do Museu Nacional, na impossibilidade de abrir o caixão de Sha-Amun, estuda a múmia por meio de tomografias computadorizadas, todas elas realizadas no CDPI, uma clínica de diagnósticos no Barrashopping. "É feita uma caixa especial e ela vai de ambulância até a clínica", explica Brancaglion, para depois emendar um elogio à forma física do xodó da coleção. "Os ossos dela até que estão bem amarradinhos."

A diva da Antiguidade tem tudo para chegar ao seu terceiro milênio fazendo sucesso, e tudo isso sem pôr a cara no sol. E, se no mundo da música gente como a cantora Lana Del Rey diz que "queria estar morta", para Sha-Amun isso é conversa furada. A crença egípcia é que, toda vez que falamos de uma pessoa, ela continua viva. "Sha-Amun deve estar muito feliz", diz Brancaglion. "Eu falo dela pra caramba." 

Fonte: Folhauol

A Fundação Cultural Palmares e o reconhecimento da tradição bantu no Brasil

Aconteceu nesta sexta-feira (23), a terceira edição do Encontro Internacional das Tradições Bantu no Brasil (ECOBANTU).  O tema é  “Afrodescendentes: reconhecimento, justiça e desenvolvimento”, em referência à Década Internacional dos Afrodescendentes, lançada pela Assembleia Geral da ONU. Tem por objetivo aumentar a conscientização das sociedades no mundo quanto ao combate do preconceito, da intolerância, da xenofobia e do racismo. O ministro da Cultura Juca Ferreira será representado pela presidenta da Fundação Cultural Palmares Cida Abreu, que participa da mesa “As políticas da Fundação Cultural Palmares e o reconhecimento da tradição bantu no Brasil”.
Tradição Banto – Várias sociedades africanas que utilizavam determinadas palavras parecidas foram chamadas de bantu pelos europeus. Aplica-se a palavra sem “s” (plural) porque o termo original africano – bantu – já significa um coletivo de seres humanos. Alguns registros indicam que os bantu eram da atual região de Camarões e, em cerca de 1000 A.C., começaram a migrar para o sul. http://goo.gl/tYefyk
O evento é uma realização do Instituto Latino Americano de Tradições Afro Bantu (ILABANTU), a programação segue durante todo o dia, na Galeria Olido, na Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, na Avenida São João, 473, Centro.
Fonte: FCP

domingo, 25 de outubro de 2015

Comemoramos o centenário de Grande Otelo ou de Sebastião Prata?

TADEU PEREIRA DOS SANTOS

Sebastião Bernardes de Sousa Prata (1915-93), negro, ator, umbandista, político, poeta, escritor, compositor, pai de cinco filhos e com outras significações constituídas ao longo de quase 80 anos. Profissionalmente, destacou-se no cinema e teatro brasileiros, com ênfase nos filmes "Moleque Tião" (1943), "Carnaval no Fogo" (1949), "Rio Zona Norte" (1957), "Assalto ao Trem Pagador" (1962) e "Macunaíma" (1969), nos quais sua interpretação o projetou no âmbito da arte.

Em 2015, afirmamos que, se Prata estivesse vivo, completaria cem anos. Contudo, as homenagens e louvações são para Grande Otelo. Podemos tomar a data de nascimento de Prata como se fosse a de Grande Otelo? Reportamo-nos ao mesmo ser ou a seres distintos? Que ligações existem entre Prata e Grande Otelo? A realidade de um é constituída da mesma natureza que a do outro? É plausível denominarmos Sebastião Prata de Grande Otelo e vice-versa? Grande Otelo completa cem anos realmente? Sebastião Prata e Grande Otelo se diferenciam pela mera transposição de nomenclatura e entre eles não há diferenciação social? Quais são as implicações de aproximá-los ou distanciá-los ou, até mesmo, tomarmos um pelo outro?

Divulgação
O ator Grande Otelo em cena do filme "Macunaíma"
O ator Grande Otelo em cena do filme "Macunaíma"

Embora a relação entre ambos suscite indagações, instauram-se, no país, plurais celebrações, em que instituições públicas ou privadas promovem ações comemorativas dos cem anos de Prata como sendo os de Grande Otelo.

A dubiedade de tomar Otelo por Prata cria a confusão entre o ser sujeito e ser personagens, por conduzi-lo à sua dimensão de produto cultural, fazendo com que a arte de Prata seja a razão do celebrar os seus cem anos de vida.
O imbróglio instaurado pelo mercado que transmuta Prata em Grande Otelo é herança dos usos e abusos em seu estreitamento à indústria cultural do país, por quase 60 anos de produção de sua memória, a qual, por reiteração, desfigurou-o em Otelo.

A confusão instalada desdobra-se em usurpação não apenas da experiência de Prata, mas de seu próprio nascer, que, de algum modo, oportunizaria sua individualização. O ser potência que deságua na pluralidade dos nós, do seu vir a ser, é silenciado e reduzido à identidade comercial, cujo grotesco, riso e vulgar o fazem um homem da arte. Desta feita, sua humanidade se faz arte conflitiva numa irrupção de seu enquadramento e a constante reiteração e veemências de suas atuações impuseram o modo de lembrá-lo para esquecê-lo como gênio, instrumentalizando o imperativo de sua harmonização social.

Pautando-se nas querelas revisionistas, as celebrações abrem novas frestas para discutir historicamente o nascimento do próprio sujeito. Há um movimento em que o literário, dado a ler como histórico, ganha ares pela circulação, cujo processo de recepção o transforma em verdade, na medida em que a novidade pauta-se mais no fabuloso, do que no se perguntar em que consiste ele ter nascido em 1915 ou 1917. Em relação a 1915, o próprio Prata afirma, em entrevista à revista "Manchete" em 1964: "Dizem que nasci a 18 de outubro de 1915, mas pelo meus cálculos tenho dois anos mais e pelos de minha madrinha... dois anos menos". Por tal horizonte, Prata já teria, então, completado cem anos, se seu nascimento ocorrera em 1913.

Historicamente, tais representações, que tateiam a experiência de Prata como Grande Otelo, reclamam sua humanização. Pelo trabalho exposto, reivindicamos a dualidade entre o sujeito (Sebastião Prata) e o produto cultural (Grande Otelo), que, embora se façam relacionais, portam constituição de naturezas distintas. Sebastião Prata, nascido em 1915, era um ser humano imbuído de valores, concepções políticas e religiosas próprias, que lhe conferem uma identidade pessoal. Cidadão negro, vinculado ao universo da negritude brasileira, relacionava-se com o mercado cultural, mas se distanciava do mesmo, na medida em que, na luta pela sobrevivência, sofria as agruras sociais. Nessa perspectiva, se fez criança, filho, adolescente, adulto, pai, ator, religioso, político, teve diversos amores, lidou com o racismo, o preconceito e a discriminação social, criando, para tanto, diversas táticas e estratégias.

Já Grande Otelo surgiu em 1935, como forma de tornar comerciável a arte de Sebastião Prata. Daí, por meio de uma negociação, o ator firmou-se como um produto cultural, criado para ser mercadoria de consumo. Pela sua constante presença no cinema e no processo de circulação de seus personagens no cenário artístico do país passa a ser objeto das apropriações dos diversos meios de comunicação. E, nesses deslocamentos, vão sendo atribuídos novos sentidos à realidade de Prata pela sua visibilidade manifesta em cartazes, folders e traillers, que direcionam o espectador a vê-lo e lê-lo no cinema como Grande Otelo.

Em relação a Sebastião Prata, podemos acompanhar o seu processo de transformação pessoal, que o define como cidadão negro, enquanto Grande Otelo se afirma como ator ícone no cenário artístico brasileiro, reconhecido nacional e internacionalmente, usurpando o lugar de Prata. O resultado desse processo são imagens produtoras do mesmo efeito cômico, definido por meio de suas atuações no cinema e no teatro, criando um produto comercial vendável.

Prata tem sua vida definida pela realidade social que experimenta, marcada pela sua dubiedade religiosa, suas performances como compositor e interprete, boêmio, político, dentre outros, daí se fazer plural pela sua complexidade. Podemos concebê-lo como um homem em meio às tensões sociais, diferindo-o do produto cultural Grande Otelo. Em última análise, deve-se compreender que a temporalidade de Prata se inscreve no período de 1915 a 1993 (nascimento-morte), enquanto a de Grande Otelo inicia-se em 1935 e finda na morte de Prata, apesar de ainda permanecer vivo na memória.

Em suma, as celebrações têm se prestado a inversões de seu significado em duplo sentido: não se pautam na reflexão sobre o sujeito celebrado, mas, ao contrário, promovem o seu próprio realce, por intermédio dele. É necessário considerar, porém, que também a celebração manifeste indícios e rastros da humanidade de Sebastião Prata, as quais, enunciadas como sombras, ficam à espera de se tornarem aberturas para sua perscrutação num vislumbre de cidadão negro que reclama a sua negritude no cumprimento e usufruto de deveres e direitos peculiares aos cidadãos brasileiros.

Assim, o horizonte de expectativas relaciona sujeito, personagens e produto cultural, interligando-os por aproximações e distanciamentos, assegurando o processo de constituição individual de cada qual, com consideração de suas vinculações. Afinal, de quem é o centenário celebrado?

TADEU PEREIRA DOS SANTOS é doutorando em história pela Universidade Federal de Uberlândia. Ele tem realizado pesquisa nas áreas de cidade, memória e biografia.

Fonte: Folhauol


Dez ações diretas de mulheres que mudaram o mundo

Desde que o mundo é desigual, e que os governos permitem que a desigualdade floresça, mulheres vêm protestando. Nós realizamos marchas de protesto e greves de fome, escrevemos cartas e propusemos leis, e deixamos de lado as vias convencionais para conscientizar e expressar nossa raiva.
Pouco mais de um século atrás, a campanha para conferir o direito de voto às mulheres no Reino Unido estava chegando a seu pico de radicalismo, e mulheres perturbavam reuniões públicas, se algemavam a grades e destruíam obras de arte e o patrimônio público.
No começo deste mês, na estreia do filme "Suffragette", manifestantes feministas protestaram no tapete vermelho em defesa do direito da mulher à provisão de refúgios.
Euan Cherry - 7.out.2015/Xinhua
Manifestantes protestam na tapete vermelho de estreia do filme "Suffragette"
Manifestantes protestam na tapete vermelho de estreia do filme "Suffragette"
A ação direta e os protestos das mulheres mudaram o mundo –como a greve das operadoras de máquinas pesadas na fábrica da Ford em Dagenham, Inglaterra, em 1968, que levou à histórica Lei de Igualdade no Salário de 1970. Eis alguns dos melhores exemplos, em um século de campanhas.
1. Sexta-Feira Negra, 18 de novembro de 1910
As ativistas que apelavam pelo sufrágio feminino marcharam até a Câmara dos Comuns do Parlamento britânico a fim de protestar contra a hostilidade do primeiro-ministro Herbert Asquith ao direito de voto para a mulher.
Em reação, dezenas de policiais as espancaram, agrediram, molestaram sexualmente e humilharam. A plena dimensão da violência sancionada pelo Estado dos homens contra a mulher foi explicitada, e as sufragistas retaliaram com uma campanha de quebra de vitrines e ataques ao patrimônio, pela qual terminaram encarceradas.
Suas táticas funcionaram e, depois de uma suspensão do ativismo durante a Primeira Guerra Mundial, as mulheres britânicas conquistaram o direito parcial de votar em 1918, e direitos plenos uma década mais tarde.
2. Miss América, 7 de setembro de 1968
Em Atlantic City, centenas de feministas norte-americanas se reuniram para protestar contra o mercado da carne dos concursos de beleza, o que resultou em um dos mais engraçados, mas também mais imprecisos, mitos fundadores da segunda onda do feminismo, o da queima dos sutiãs pelas mulheres para simbolizar sua emancipação do patriarcado.
Qualquer pessoa que tenha tentado queimar um sutiã –especialmente aqueles modelos pesados, opacos e cor da pele que existiam no pós-guerra– sabe que eles não queimam muito bem. As armações dos sutiãs foram arrancadas e jogadas nas Latas de Lixo da Liberdade, em companhia de sapatos de salto alto, cílios postiços, cópias das revistas "Cosmopolitan" e "Playboy", panelas, esfregões e frigideiras –itens que as manifestantes descreviam como "instrumentos de tortura à mulher".
O protesto deu origem a uma nova onda de críticas a uma série de coisas, como a objetificação da mulher e a feminilidade performática, os ideais de beleza e a exploração do trabalho caseiro, e essa visão da questão terminou incorporada à cultura.
3. Islândia, 24 de outubro de 1975
Estimuladas pelo ativismo do Meias Vermelhas, um grupo feminista radical, 90% das mulheres da Islândia fizeram greve nesse dia contra a exploração do trabalho doméstico gratuito da mulher pelos homens, e do trabalho feminino em geral –mal pago, mal reconhecido e mal recompensado com promoções.
Por um dia, elas não trabalharam e se recusaram a cuidar das tarefas domésticas e das crianças, e a limpar e administrar as casas. A Islândia ficou paralisada, como ficaria qualquer outro país em que isso acontecesse.
A greve demonstrou até que ponto a sociedade funciona com base em trabalho pelo qual as mulheres não recebem crédito. Passados mais de 30 anos, a Islândia é renomada como um dos países mais igualitários do planeta. Talvez todas nós devêssemos aprender com o Meias Vermelhas.
4. Willesden, Londres Norte, 1976-1978
Em um protesto que expôs preconceitos de raça e idade e a misoginia do movimento sindical, bem como a exploração da mão de obra imigrante pela indústria, Jayaben Desai liderou protestos das empregadas do laboratório fotográfico Grunswick Film Processing, em sua maioria mulheres, maduras e de origem leste-africana ou asiática.
As greves resultaram em violentos ataques pela polícia, mas em longo prazo a força das trabalhadoras asiáticas criou um desafio para o movimento sindical e promoveu maior diversidade, demonstrando ao governo e à mídia o poder dos trabalhadores unidos para defender seus direitos.
5. Afeganistão, maio de 2007
A líder política Malalai Joya recebeu todo o peso da condenação patriarcal ao denunciar os líderes de milícias e criminosos de guerra com os quais precisava dividir o espaço político do Legislativo afegão, e se pronunciou contra o apoio dos aliados ocidentais à liderança do então presidente Hamid Karzai.
17.dez.2003/Associated Press
Malalai Joya, delegada na Loya Jirga, discursa contra os chefes de guerra do Afeganistão
Malalai Joya, delegada na Loya Jirga, discursa contra os chefes de guerra do Afeganistão
Por sua bravura, ela foi privada de seu papel político, apesar do apoio de ativistas de todo o mundo. Ainda assim, o fato de que ela tenha se pronunciado colocou em questão a aprovação ocidental tácita a Karzai e desafiou a imagem ocidental da mulher afegã como passiva e simpática ao regime. Isso fez de Joya um exemplo para a dissensão política em seu país.
6. Mangalore, Índia, fevereiro de 2009
Depois que diversas mulheres que estavam se divertindo em um bar no dia dos namorados foram perseguidas, espancadas e chutadas por uma gangue de homens, alguns dos quais gravaram em vídeo o ataque, um grupo intitulado Consórcio das Mulheres Fáceis e Avançadas que Vão a Bares descobriu uma nova maneira de expressar apoio às mulheres e ridicularizar os agressores e aqueles que os defendiam.
A campanha "Pink Chaddi" enviou como presente de dia dos namorados milhares de enormes calcinhas cor de rosa ao movimento conservador Sri Ram Sena, ao qual alguns dos agressores afirmavam pertencer. O objetivo era voltar contra os agressores toda a vergonha sexual, humilhação e menosprezo que eles desejavam instilar em suas vítimas. Quando palavras de protesto não funcionam, às vezes uma calcinha gigante e cor de rosa diz o necessário.
7. Kampala, Uganda, fevereiro de 2014
A lei do governo ugandense para culpar as vítimas ao proibir "roupas indecentes", conhecida em tom de zombaria como "lei da minissaia", submeteu mulheres a agressões de homens que as despem na rua, e ainda as culpam pela violência que sofrem.
Os protestos das mulheres contra isso incluíram canto, dança, minissaias e cartazes que proclamavam "meu corpo, meu dinheiro, meu armário, minhas regras". A despeito do governo repressivo, responsável por novas leis homofóbicas e misóginas, a resistência das ativistas de base está crescendo.
8. Lima, Peru, 7 de março de 2014
As feministas do Peru se vestiram de vermelho e se deitaram na rua diante do Ministério da Mulher.
A manifestação era uma celebração dos corpos das mulheres abusadas no país, que não recebem justiça ou reconhecimento, e simbolizava que o governo estava espezinhando os direitos da mulher. A linha formada pelas mulheres a um só tempo parecia uma linha simbólica de limite –não aceitaremos mais– e também uma exposição da vulnerabilidade das mulheres quando o direito a proteção contra a violência não é honrado pelos líderes políticos.
9. Pequim, China, março de 2015
O movimento feminista vem realizando jogadas astutas na capital chinesa, a despeito da repressão policial e da sabotagem. Este ano, um grupo de cinco "guerrilheiras terroristas" foi detido antes de protestos planejados para o Dia Internacional da Mulher.
O foco do protesto era a atitude do país quanto à violência do homem contra a mulher, assédio sexual e violência sexual, e a manifestação mais notável foi uma parada de mulheres usando vestidos de noiva brancos e ensanguentados.
Além da defesa desses direitos humanos fundamentais, também existe um florescente movimento "fazer acontecer", inspirado pelo livro de Sheryl Sandberg e liderado por mulheres jovens e ambiciosas que pela primeira estão tendo de enfrentar o sexismo empresarial e do mercado de trabalho.
10. Londres, 7 de outubro de 2015
Joel Ryan - 7.out.2015/Associated Press
O grupo Sisters Uncut na estreia de "Suffragettes"
O grupo Sisters Uncut na estreia de "Suffragettes"
No começo do mês, na estreia do filme "Suffragette", ativistas do grupo Sisters Uncut atravessaram as barreiras de segurança e protestaram contra o corte de serviços do governo às sobreviventes da violência doméstica e da violência sexual masculina.
Espero que elas atinjam seus objetivos imediatos de serviços adequados e protegidos, e dotados de verbas suficientes, para as vítimas e sobreviventes. E espero que a longo prazo, em todo o mundo, consigamos nossos objetivos de um mundo livre de desigualdade, exploração e violência masculina.

BIDISHA
DO "GUARDIAN"
Tradução de PAULO MIGLIACCI 

Fonte: Folhauol

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

‘Mister Brau’, da Globo, é notícia no Reino Unido por abordar racismo










A série Mister Brau, que substituiu o sucesso de audiência Tapas & Beijos nas noites de terça na Globo, virou notícia na Inglaterra por abordar o racismo no Brasil -- país ainda envolto pelo mito da democracia racial. O jornal britânico The Guardian publicou um artigo nesta quarta-feira em que discute o lugar do negro na televisão brasileira e mostra como a participação negra na dramaturgia nacional é restrita e carregada de preconceito: 75% dos papeis destinados a atores negros no país são para personagens em posição de subserviência, dado retirado do documentário A Negação do Brasil, de Joel Zito Araújo.
O casal protagonista, Lázaro Ramos e Taís Araújo, é descrito pela publicação como o Jay Z e a Beyoncé brasileiros e a participação dos dois na série é apontada como uma importante tentativa de mudar o racismo presente na televisão nacional.
O jornal inglês ainda faz um panorama do preconceito racial no Brasil, citando uma pesquisa conduzida pela professora de antropologia da USP Lilian Schwartz. Nela, 96% dos brasileiros disseram não acreditar que exista racismo no país, mas 99% afirmam conhecer alguém que seja racista. Os números que, como se vê, são contraditórios, revelam que há algo de podre no Reino na Dinamarca -- ops, no Brasil.
Após um breve resumo da história brasileira e da intensa imigração de escravos africanos durante séculos, o Guardian conclui que o país está vivendo uma inédita ascensão de negros, que passaram a se fazer mais presentes nas classes dominantes. Apesar de tardio e lento, o processo vem acontecendo no Brasil e os negros têm ganhado espaço na televisão. O jornal ainda cita a apresentadora Maria Julia Coutinho, a Maju, vítima recente de racismo nas redes sociais.

Cineastas são recebidos pelo Ministro da Secom e presidente da EBC

Na quarta (14/10), se reuniram o Ministro em exercício da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom), José Otaviano Pereira; o presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), Américo Martins; a presidenta da Fundação Cultural Palmares Cida Abreu, com uma comissão de cineastas. Na pauta foi tratado de parcerias com a Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura (SAV), políticas públicas de reconhecimento e visibilidade dos produtores negros e para a cultura afro-brasileira.
Segundo Otaviano Pereira, nosso compromisso é fazer com que as reivindicações sejam efetivadas; em diálogo com outras áreas, reconhecendo a diversidade da cultura brasileira; visando garantir a representação da diversidade cultural; veicular programas; filmes; séries e debates que abordem os temas atuais.
Para a Cida Abreu, esta ação está prevista nas metas do Plano Nacional de Cultura e dialogam, com a agenda de combate a intolerância religiosa, capacitar e valorizar a mão de obra; como uma das estratégias de enfrentamento ao genocídio da juventude negra.
Essas ações fazem parte do Programa Diálogos Palmares, na perspectiva de construir uma nova narrativa de compreensão e representação da cultura afro-brasileira; na estética; culinária; economia; a capacidade de ditar tendências, valorização dos territórios contemporâneos; das periferias; urbanos.
Já Américo Martins, se comprometeu com a reformulação na grade da emissora, visando dar outro olhar; a valorização da cultura afro-brasileira na programação da TV pública.
Para o ator Milton Gonçalves, apesar do Brasil ser o país mais negro fora da Nigéria, com 53,2% da população; mesmo assim, sofremos com a sub-representação na mídia e nos espaços de poder.
Participam ainda, os cineastas Jeferson De, Maria Patrícia, o ator Milton Gonçalves, Maria Patrícia, Luiz Antônio da Silva, Joelzito Almeida de Araujo, Antônio Pilar, Biza Viana e Joelzito Araujo; Anderson Quack, Diretor do DEP/FCP e Newton Guimarães, chefe de Divisão e Coordenador do PRONAC da Fundação Cultural Palmares.
Fonte: Fundação Cultural Palmares

Parceria com o Google possibilitará o georreferenciamento de comunidades quilombolas



Nesta quinta-feira (22), a presidenta da Fundação Cultural Palmares Cida Abreu, se reuniu com o Diretor Executivo da Equipe de Conservação da Amazonia, Vasco M. Van Roosmalen. Trataram do protocolo de intensões para viabilizar um programa de georreferenciamento das 2.607 comunidades tradicionais quilombolas certificadas pela autarquia. A reunião também foi acompanhada por Juliana Dib Rezende, representando o Google Earth Solidário.
Segundo Cida Abreu, “esta parceria possibilitará o georreferenciamento das comunidades certificadas e suas manifestações culturais, além do desenvolvimento de um aplicativo, onde, a juventude será novos resistentes da transmissão oral quilombola” destacou.
O projeto foi iniciado em 2007; quando o cacique Almir Suruí, propôs para auxiliar a aldeia na proteção da floresta e divulgação da sua cultura. A parceria com a Kanindé, Associação de Defesa Etnoambiental, possibilitou o mapeamento do território do povo Paiter Suruí, em Rondônia; incidindo sobre a formulação de políticas públicas, incluindo a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas.
Segundo Roosmalen, os impactos são o fortalecimento do potencial da gestão dos territórios dessas comunidades; a comunicação; a cultura e a geração de renda; a partir da percepção do uso da ferramentas como o Google Earth pelos movimentos de Direitos Humanos e ambientalistas, na divulgação dos impactos socioambientais do desmatamento de áreas ameaçadas.
A Fundação Cultural Palmares, foi convidada a participar de 7 a 11 de dezembro, de uma capacitação; onde etnias indígenas e comunidades quilombolas; receberão treinamento para o uso do aplicativo. O evento conta com o apoio da prefeitura de Porto Velho e do governo do estado de Rondônia.
Daniel Gomes
Fonte: Fundação Cultural Palmares

ONU mobiliza jovens para combater a violência a raparigas em Moçambique

Projeto pretende abranger cerca de 200 rapazes e raparigas de escolas nos distritos de Angónia e Chiúta; iniciativa tem o apoio do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre Eliminação da Violência contra Mulheres e Raparigas.


Foto: Unicef/Marc Lehns

Ouri Pota, da Rádio ONU em Maputo.
Uma iniciativa que tem o apoio do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre Eliminação da Violência contra Mulheres e Raparigas busca mobilizar jovens para o combate ao problema.
O projeto pretende abranger cerca de 200 rapazes e raparigas da Escola Secundária de Ulongué, no Distrito de Angónia, e da Escola Primária Completa de Mange, no Distrito de Chiúta. Trata-se de áreas da província central de Tete.
Mobilização
O Programa tem como objetivo contribuir para o fortalecimento de políticas de governo para proteger mulheres e raparigas contra a violência e capacitá-las para que exijam o respeito a seus direitos.
A mobilização está a ser feita através de reflexões e debates sobre o que é a violência, seus diferentes tipos e seu impacto na vida das raparigas.
As atividades pretendem contribuir para mobilizar indivíduos e instituições no combate a violência a raparigas e mulheres.
Campanha
A campanha das Nações Unidas, em parceria com a Direção Provincial de Género, Criança e Ação Social  decorre até 24 de outubro. A mesma envolve jovens e raparigas da 8ª à 10ª classe.
No final da ação, os estudantes irão formular uma agenda de ação que será partilhada na cerimónia do encerramento, junto com os resultados das discussões realizadas durante a época de sensibilização.
Fonte: radioonu

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

O médico que merecia ter ganho o Nobel da Paz

O Quarteto de Diálogo Nacional da Tunísia levou o Nobel da Paz deste ano por mostrar que há, sim, final feliz para países que passaram pela Primavera Árabe –embora seja raro e dependa de concertos políticos como o engendrado na Tunísia.
Sem tirar o mérito dos tunisianos, acho que o prêmio deveria ter ido para um país africano mais ao sul –a República Democrática do Congo (RDC).

Mas, pelo terceiro ano seguido, o médico congolês Denis Mukwege, 60, um dos mais cotados para o prêmio, foi esnobado pelo comitê do Nobel.

Mukwege é o maior especialista do mundo em cirurgias para reparar danos internos em vítimas de estupro coletivo. Desde 1998, o hospital que ele fundou na República Democrática do Congo, chamado Panzi, tratou mais de 30 mil mulheres estupradas nas guerras do país.

Frederick Florin - 26.nov.2014/AFP
Denis Mukwege na cerimônia do Prêmio Sakharov do Parlamento Europeu, em Estrasburgo (França)



Denis Mukwege na cerimônia do Prêmio Sakharov do Parlamento Europeu, em Estrasburgo
 (França)

O estupro é usado como arma de guerra na República Democrática do Congo desde o início da primeira guerra no país, em 1996.

Embora seja difícil apurar números precisos, a ONU estima que 200 mil mulheres tenham sido estupradas nos conflitos. Muitas são atacadas de forma tão violenta que sofrem dano permanente nos órgãos internos. Meninas a partir de cinco anos e idosas de 80 anos foram mutiladas, muitas vezes na frente de suas famílias.

O hospital Panzi, fundado com ajuda de uma ONG sueca, fica na cidade de Bukavu e acolhe mulheres de todo o país, que muitas vezes viajam centenas de quilômetros para cirurgias de reconstituição da vagina e aconselhamento psicológico.

Mukwege desenvolveu uma técnica menos invasiva para tratar a fístula vaginal –um rompimento entre a vagina e o ânus ou entre a vagina e a bexiga por causa de estupros violentos ou partos muito difíceis. Como consequência da fístula, a mulher não consegue segurar a urina ou as fezes e pode ter vários tipos de infecções.

O congolês também implementou um programa de treinamento para enfermeiras e médicos tratarem as vítimas de estupro. O programa inclui desde cirurgias de reconstrução até tratamento para sífilis e HIV, que muitas mulheres contraem nos estupros.

Mukwege mora e trabalha no hospital, e faz cirurgias duas vezes por semana.
Em outubro de 2012, homens armados invadiram sua casa no Congo e mantiveram suas filhas reféns enquanto esperavam que ele retornasse. Quando o médico chegou, um segurança tentou intervir, acabou morto, e Mukwege escapou se jogando no chão. Depois disso, o médico se mudou para a Europa com a família.

Mas voltou a Bukavu em 2013 e foi recebido calorosamente pela comunidade. Seus pacientes haviam arrecadado fundos vendendo abacaxis e cebolas para pagar sua passagem.

Mukwege nasceu em 1955, o terceiro de nove filhos. Ele estudou medicina na RDC antes de se especializar em ginecologia na Europa, após ver muitas mulheres morrerem em seu país por causa de complicações do parto.

O médico já recebeu inúmeros prêmios por seu trabalho –entre eles, o Prêmio de Direitos Humanos da ONU, em 2008, e o Prêmio Sakharov do Parlamento Europeu, em 2014. Em 2015, ele recebeu o título de doutor honoris causa da Universidade Harvard.

Falando sobre o estupro como arma de guerra, Mukwege afirmou ao diário britânico "The Guardian": "É um método de tortura. Uma maneira de aterrorizar a população. Quando vejo alguns dos ferimentos nas mulheres e crianças, chego à conclusão que esse tipo de violência tem pouco a ver com sexo: é uma forma de exercer poder através de terrorismo".

Segundo ele, o mais difícil é quando ele ajuda uma mulher a dar à luz uma menina, resultado de estupro, e anos depois precisa "tratar essa mesma menina, que também foi estuprada."

"Essa será a destruição do povo congolês. Se destruírem úteros suficientes, não haverá crianças. Então por que vocês não vêm direto e pegam os minerais logo?"
A RDC é rica em coltan, um mineral usado na fabricação de celulares e outros aparelhos eletrônicos, que está no cerne de vários conflitos no país.

Patrícia Campos Melo
Fonte: Folhauol

ABL apresenta troca de cartas entre Machado de Assis e José Veríssimo

Resultado de imagem para fotos de machado de assis
Divulgação

Uma espécie de "troca de e-mails" sobre amenidades entre o maior ícone da literatura nacional, Machado de Assis, e um de seus colegas fundadores da Academia Brasileira de Letras (ABL), José Veríssimo.

Foi com essa analogia que a ABL apresentou nesta quinta-feira (15) 12 cartas inéditas de Machado de Assis que foram encontradas pelos herdeiros de Veríssimo em um apartamento no Flamengo, na zona sul do Rio.

Os documentos, parte do acervo de Veríssimo, foram doados à ABL há dois meses.
Dentre as 61 cartas encontradas, 12 eram inéditas. Fiquei emocionadíssima ao ver todo material", afirmou a pesquisadora Irene Moutinho, especialista na obra de Machado.

"São correspondências curtas e bilhetes que trocavam entre eles. São importantes, pois fazem uma ponte com outras que estão na coleção. Era como se fosse uma forma pontual de mandarem e-mail um para o outro."

Além da correspondência, também foram descobertas ao menos três fotografias nunca vistas na iconografia de Machado.

Os documentos encontrados também ajudaram a descobrir erros de transcrição em materiais já publicados.

"Li todas as correspondências encontradas no acervo e até notei algumas discrepâncias das transcrições anteriores para o original. Por mais cuidados que tenham as pessoas que transcrevem, às vezes é uma vírgula que falta, um parágrafo que não tinha", disse Moutinho.

O material foi doado por Helena Araujo Lima Veríssimo, viúva do neto de José Veríssimo. Ele inclui ainda artigos de jornais, fotografias e correspondências para familiares e amigos.

Entre as fotografias encontradas de Machado de Assis, chamou a atenção dos pesquisadores uma imagem em rara posição frontal, tirada quando o escritor tinha cerca de 50 anos.

Para o presidente da ABL, Geraldo Holanda Cavalcanti, a doação pode servir de exemplo. Segundo ele, muitos materiais podem se perder se não receberem os cuidados devidos.

"É um acervo precioso, corresponde a uma época muito importante da ABL em 1916. Esse material é muito difícil de ser guardado em casa, se estraga com o tempo. Aqui temos um departamento com a melhor técnica de conservação que existe em matéria de documentos", afirmou Cavalcanti.

Fonte: Folhauol

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Contra machismo na literatura, projeto estimula leitura de autoras

Juliana Leuenroth e Juliana Gomes se conheceram há sete anos, quando trabalhavam na Livraria da Vila. Tempos depois, Leuenroth apresentou a Gomes uma amiga, Michelle Henriques, coautora do blog "As Bastardas". As três tinham três coisas em comum: gostavam de literatura, eram feministas e, em contraste a isso, suas bibliotecas pessoais tinham majoritariamente livros escritos por homens.

A percepção deste cenário foi o estopim para a criação do projeto Leia Mulheres, em março deste ano. Trata-se de uma espécie de clube do livro que busca estimular a apreciação de textos literários de escritoras.

"Continuamos a ler homens, mas precisamos incentivar a produção, a publicação e a divulgação de livros escritos por mulheres também", diz Gomes. "Assim como também a formação de críticas literárias, jornalistas culturais e curadoras de projetos sociais que utilizem a literatura como fio condutor do início de uma mudança."

Nesses sete meses de existência, o Leia Mulheres já realizou sete encontros em São Paulo e outros seis no Rio de Janeiro. Em cada um, cerca de 20 pessoas —inclusive homens— se acomodam nos fundos de uma livraria e debatem os títulos lidos, que vão de clássicos como "Frankenstein", de Mary Shelley, a contemporâneos como "A Amiga Genial", de Elena Ferrante.

Recentemente, o projeto começou a se expandir para outras praças. "Estamos em dez cidades e, até o final do ano, devemos estar em mais cinco", afirma Gomes. Apenas em outubro ocorrem oito encontros nas cidades de São Paulo, Porto Alegre, Fortaleza, Curitiba, Brasília, Recife, São Luís e Itapetininga. O calendário está disponível no site do projeto, em leiamulheres.com.br.

Daniela Nunes
Juliana Gomes, Juliana Leuenroth e Michelle Henriques, idealizadoras do Leia Mulheres

Juliana Gomes, Juliana Leuenroth e Michelle Henriques, idealizadoras do Leia Mulheres
FIM AO CLUBE DO BOLINHA LITERÁRIO

A inspiração para o projeto foi a campanha #readwomen2014, idealizada pela escritora inglesa Joanna Walsh, que propunha a leitura de mais mulheres.

"Escritoras são, a maior parte do tempo, julgadas pela sua aparência, em vez de serem julgadas pela qualidade de sua escrita", disse a escritora no começo da campanha, em entrevista à revista "Língua Portuguesa". "No Reino Unido, a historiadora clássica Mary Beard foi chamada de 'feia demais para a televisão', enquanto a vencedora do Booker Prize Eleanor Catton, 'apesar de nerd', é 'aceitável' porque é 'bonitinha'."

Para Walsh, a diferença de gênero influencia até mesmo na produção de livros, que "muitas vezes, publicados com capas e títulos que fazem com que o establishment literário não os tenha que levar a sério". "Aos escritores, em entrevistas, é perguntado o que pensam, enquanto às mulheres é perguntado o que sentem."

Não é apenas na terra de Walsh que o sexo feminino tem menos espaço. Nas mesas da edição deste ano da Flip - Festa Literária Internacional de Paraty, o maior evento do gênero no país, passaram 43 personalidades, das quais 11 eram mulheres - 25,6%.

"Este é um problema da área cultural em geral. Todo mundo que trabalha com cultura hoje em dia enfrenta esta questão da presença de mulheres - presença menor do que o desejado", diz Paulo Werneck, curador das últimas duas edições da Flip e recentemente confirmado como ocupar a vaga na edição de 2016. "Estamos aumentando a presença de mulheres progressivamente."

De fato, a gestão de Werneck trouxe mais mulheres à Flip. Nas duas últimas edições, o percentual de participação feminina na festa foi de 21,1%; nos três anos anteriores, foi de 17,8%, em média.

"Não está no nível que a gente gostaria, mas há um aumento", diz Werneck. "E estamos aumentando gradativamente."

Este aumento pode indicar um futuro promissor. O presente, contudo, não é satisfatório. "Ainda existe preconceito [contra mulheres]", afirma Leuenroth. "Queremos igualdade de oportunidades e diversidade de olhares. Queremos evidenciar as diferenças que existem entre homens e mulheres —diferenças nas escolhas editoriais, em como os livros são trabalhados na editora e até mesmo em como muitas mulheres têm seus livros rejeitados para publicação."

Um dos exemplos mais significativos de machismo no meio literário é o caso da escritora norte-americana Catherine Nichols. Em abril de 2015, cansada de ser rejeitada por agentes literários, Nichols resolveu enviar o manuscrito de seu livro sob o pseudônimo de George. Ao usar um nome masculino, conseguiu 8,5 vezes mais respostas positivas. "Meu romance não era o problema", disse Nichols, em artigo publicado no site Jezebel. "O problema era eu, Catherine."

Para Nichols, o nome fez toda a diferença; para as idealizadoras do Leia Mulheres, não deveria fazer diferença alguma. No ano em que uma escritora ganhou o Nobel de Literatura —Svetlana Alexievich foi a 14ª entre os 108 laureados desde 1901—, elas querem que o texto seja apreciado sem distinção de gênero.

"Ficamos felizes quando uma mulher ganha um prêmio como o Nobel ou o Jabuti", diz Gomes. "Mas o que queremos é que isso não seja motivo de comemoração, que seja apenas pelo texto." 

RODOLFO VIANA

Fonte: Folhauol

Calendário internacional da cultura negra




Dia 01
- Fundado o Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAFRO). São Paulo/SP (1980).
Dia 07
- Dia de Nossa Senhora do Rosário, patrona dos negros.
Dia 10
- Morre Francisco Lucrécio, Secretário da Frente Negra Brasileira, em São Paulo (2001).
Dia 11
- Nasce Agenor de Oliveira, o Cartola. Cantor e compositor negro, figura entre os maiores representantes da Música Popular Brasileira. Rio de Janeiro/RJ (1908).
Dia 12
- Dia de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, considerada protetora dos negros. São Paulo/SP (1717).
Dia 13
-Criação do Teatro Experimental  do Negro (TEN). Rio de Janeiro /RJ (1944)
Dia 15
- Nasce Grande Otelo, ator de cinema e TV e um dos ícones da cultura negra. Rio de Janeiro/RJ (1915).
Dia 24
- Morre Rosa Parks, líder do Movimento dos Direitos Humanos. América do Norte/EUA (2005).
Fonte: FCP

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Há preconceito contra negros, diz Gustavo, 11, colunista da 'Folhinha'

Eram 2h30, mas Gustavo Gomes ainda estava acordado. É que o garoto leva a sério o desafio de escrever: "Mudei os textos umas cinco vezes e ainda achei que não ficaram bons".

Aos 11 anos, o menino se esforçava na madrugada para terminar as quatro colunas que deveria escrever para serem publicadas na "Folhinha". Ele estreia como novo colunista do caderno neste sábado (10), falando sobre diversidade e igualdade.
"No meu colégio tem bastante gente negra, mas acaba tendo preconceito", diz o garoto, que é negro e estuda em uma escola municipal no Itaim Paulista (zona leste de São Paulo). "Uma menina tinha nojo de mim na primeira série, falava que não era para eu tocar nas coisas dela." Ele afirma ainda já ter sido hostilizado pelos colegas por não gostar de futebol e por ser muito estudioso.

Na coluna "Ideias....", Gustavo vai falar também de outros assuntos do dia a dia na escola, como a tensão da semana de provas. "O professor tem que dar mais chance para os alunos darem sua opinião na aula, e não ficar falando sem parar", critica.
O garoto chamou a atenção na internet ao discutir sobre racismo em um vídeo que teve quase 395 mil visualizações. Em entrevista à Folha, conta qual foi o melhor dia de sua vida e quais são seus sonhos, entre eles o de escrever um livro que faça mais sucesso que "Harry Potter". Leia abaixo a conversa.

Se você quer ser um colunista como Gustavo, é só mandar um texto de mil caracteres para folhinha@uol.com.br, com nome, idade e "Ideias" na linha de assunto. O autor muda a cada mês e deve ter até 12 anos. O conteúdo é livre, você pode falar sobre brincadeiras, games e outros temas.

Foto divulgação
Novo colunista da Folhinha Gustavo Gomes, 11 – Reprodução/Facebook
Gustavo, 11 anos

Você já sofreu preconceito?
Já sofri muito preconceito, por ser negro, por ser esperto e por não gostar de futebol. Quando tinha 9 anos, falavam que eu não era homem, que não era macho porque não gostava de jogar bola. O pessoal também ficava me chamando de "nerd", falando que eu deveria usar óculos. Mas acho que não combina com o meu rosto, fica um negócio muito grande. Se bem que acho que vou precisar mais para frente, porque leio muito e fico muito no computador.

O que houve para você achar que estava sendo vítima de preconceito?
As pessoas me xingavam muito de negrinho, de negrinho pastoreiro. Na minha escola tem bastante gente negra, mas acaba tendo preconceito. Já sofri preconceito até de pessoas negras e de pessoas que têm amigos negros. Uma menina tinha nojo de mim na primeira série, falava que não era para eu tocar nas coisas dela. Dizia: "Eu tenho nojo de gente negra". E eu respondia: "Também sou humano, também sou gente, tenho que ser tratado igual". Mas você pode usar o melhor argumento do mundo, e a pessoa não vai ouvir, porque você é negro e ela já está com isso na cabeça. É só uma desculpa para dizer que não gosta de você.

O que você mais gosta de fazer?
Gosto de ler, de conversar e de ficar na internet. Fico procurando curiosidades, principalmente no Fatos Desconhecidos e no Mega Curioso. São os dois melhores sites da internet. Eu fico nisso o tempo inteiro, umas cinco horas por dia. Eles falam sobre coisas que ninguém sabe, tipo que sal também serve para limpar a panela. Se a comida ficar grudada e você jogar sal, ela sai mais rápido.

Qual é sua matéria preferida na escola?
Varia com o professor. No ano passado, eu não tinha matéria preferida, porque só uma professora ensinava todas as matérias e eu não gostava dela. Nesse ano, eu estou gostando mais de português, porque a professora é bem legal.

O que faz um professor ser bom?
O jeito que ele aborda a aula. Tem que bater papo, conversar, perguntar a opinião. Tem que dar mais chance para os alunos falarem na aula, e não ficar falando sem parar.

Qual foi a coisa mais legal que você já fez?
A coisa mais divertida que eu já fiz foi uma viagem para Santos. Nunca tinha ido para a praia, foi maravilhoso! A melhor coisa foi dar uma cambalhota completa junto com a onda. Eu tinha uns seis anos, não lembro de nada antes disso, minha vida começou na primeira série. Por ter aquele valor sentimental de ser a primeira vez, foi um divisor de águas na minha vida. É como se fosse antes e depois da cambalhota: a.C. e d.C.

Qual é o seu maior sonho?
Meu maior sonho? Nossa, eu sou muito sonhador. Na verdade muito iludido mesmo. Sei lá, conhecer o Barack Obama... Quero escrever um livro que faça mais sucesso que 'Harry Potter', que consiga ter tanto fã quanto ele. Já está no meu planejamento de vida. Mas ainda não sei sobre o que vai ser.

O que quer ser quando crescer?
Estou superindeciso entre ser escritor, psicólogo e arquiteto. Faz um ano que estou nessa indecisão.

Qual é a parte mais legal de ser o novo colunista da "Folhinha"?
É uma coisa bem alucinante, porque, um ano atrás, se alguém falasse que eu ia escrever uma coluna na Folha, eu ia falar: "Aham, senta lá". E nesse tempo virei colunista e escrevi um livro de poemas. Vou lançar no dia 17 de outubro, aqui na biblioteca da escola. São poemas sobre tudo, desde café até planetas.

Tem alguma coisa sobre a qual você queria escrever, mas não escreveu?
Sobre música. Sempre quis dar a minha opinião, mas eu definitivamente não consigo escrever sobre música. Já tentei, mas saiu tão ruim que nem levei para as crianças e para a professora lerem. Não mostrei para ninguém. Até rasguei. Fico triste, porque eu gosto muito de ouvir e de cantar.

Acha que toda criança pode escrever um bom texto?
Acho que sim, só precisa de esforço. Não pode falar "eu não consigo". Se você quer alguma coisa, tem que se esforçar. Acho que falta compromisso, não só entre as crianças, mas entre as pessoas. Elas acham que aquilo ali é só uma tentativa, se distraem com qualquer coisa. Tem que terminar. Você tem que se empenhar naquilo e colocar como projeto principal, e não deixar em segundo plano.

O que recomendaria para quem quer ser um colunista como você?
Recomendo que se esforce, que não deixe para escrever no último minuto. Coloque o melhor de si, revise o máximo que puder e veja se outros acham bom, além de você. Não é só escrever e mandar.

JÚLIA BARBON
DE SÃO PAULO

Fonte: Folhauol

Mulheres Pretas

    Conversar com a atriz Ruth de Souza era como viver a ancestralidade. Sinto o mesmo com Zezé Motta. Sua fala, imortalizada no filme “Xica...