quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Por que você escreve essas coisas de preto?” por Higor Faria

20 de novembro


Recentemente, me perguntaram por que escrevo essas “coisas de preto”. Não foi só uma vez.
Poderia dizer que escrevo “coisas de preto” porque sou preto, ou porque quero afirmar e externalizar a minha identidade. Assim como seria possível dizer que escrevo a fim de encontrar, por meio das “coisas de preto”, outros pretos — inserção, acolhimento e proteção. Posso também afirmar que escrevo para que outros pretos se projetem e encontrem pares de vivências. Tudo isso é motivação e não deixa de ser verdade.
E mais. É válido falar que escrevo “coisas de preto” para denunciar tanto o genocídio da nossa juventude negra quanto a falta de oportunidade e os obstáculos impostos especificamente aos negros quando se fala em escolaridade e mercado de trabalho. Ou ainda para derrubar padrões que excluem o corpo negro ou que o coisificam por meio da hipersexualização. Escrevo “coisas de preto” por isso também, não é mentira.
Escrevo “coisas de preto” por querer ser um contador de histórias. E quero também contar a nossa história, como muitos outros negros já fazem há mais tempo e melhor que eu. O protagonismo me impulsiona: preto contando nossas “coisas de preto”.
Tô cansado de não negros dizendo como devemos ser,pensar e agir. De forma geral, isso só resultou em exclusão, em marginalização, em estigmatização e em genocídio de quem é preto. Existem as exceções. Existem, mas, por mais que haja um nível de empatia transcendental, o branco nunca vai dar de cara com os mesmos obstáculos, quem dirá ter que superá-los. Aliados são mais que bem-vindos. A luta precisa de vocês. Mas o protagonismo é nosso, é preto.
É tempo de nossa voz ser ouvida e respeitada. Há um pensamento coletivo de que nós, pretos, somos radicais quando falamos de racismo, enquanto brancos são sensatos falando do mesmo assunto com as mesmas palavras. Escrevo para acabar com essa lucidez seletiva que legitima só o outro, o não preto, para contar as nossas “coisas de preto”.
Tem quem cante, tem quem atue, tem quem produz, tem quem legisla, e tem quem debate “coisas de preto”. Eu escrevo. É a arma que possuo. Posso até não manejá-la da melhor forma — ainda. Tenho noção que o aprendizado é constante e a vontade de acertar o alvo é grande. E também é por isso que escrevo essas “coisas de preto”.
Sigo com o racismo na mira: uma hora ele não escapa!
Fonte: Geledes

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