sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Afrodescendente brasileira treina na mais prestigiada Academia Militar da América



Kizzi Fernanda. Foto: Divulgação


Desde o início do ano, o lar da gaúcha Kizzy Fernanda Terra Ferreira dos Reis é West Point, a mais prestigiada Academia Militar da América, localizada a 80 quilômetros de Nova York, nos Estados Unidos. Ela estuda como intercambista no centro de formação de cadetes com dois séculos e meio de existência.
Filha de um servidor público estadual e de uma professora do município de Porto Alegre, Kizzy não se imaginava vestindo farda. Até a adolescência era uma garota como as outras, com um incomum pendor para a matemática. Foi então que, em busca de bom preparo para o vestibular, conseguiu uma disputada vaga no Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA).
Entrosada na mescla de estudo rigoroso e disciplina castrense, teve aprovação simultânea, aos 17 anos, em três rigorosas instituições de ensino militares (da Marinha, da Aeronáutica e do Exército). Optou por este último, ao cursar o Instituto Militar de Engenharia. E não parou aí.

Aos 21 anos, Kizzy é a primeira gaúcha a participar da missão brasileira de intercâmbio de estudos e treinamento militar em West Point, que está em sua terceira edição. Chegou lá a partir de seu desempenho escolar em 2012, quando estava no 3º ano do Ensino Médio.
No início deste ano, em seu primeiro período em West Point, participou de uma tradicional competição militar, a Sandhurst, que congrega alunos militares do mundo inteiro.
Para ser escolhida como representante do IME na disputa, a gaúcha participou de uma seleção interna no IME, com testes físicos dignos de um Rambo: incluíam corrida, flexões, abdominais e sustentação na barra. Kizzy obteve o primeiro lugar e se habilitou a ser primeira representante oriunda do Colégio Militar de Porto Alegre a participar desse torneio militar internacional. A competição envolve homens e mulheres, algo incomum no Brasil.
Desde julho, o mundo de Kizzy virou um quartel gigante. Recebe instruções teóricas e práticas de orientação diurna e noturna. De tiro de fuzil, de morteiro e de artilharia. De comunicações por rádio e fio. Faz patrulhas, corre em pista de obstáculos, treina combate urbano e subida por cordas e, quando já não aguenta mais, vem mais exercício. Ao final da uma das atividades de campo, por exemplo, teve de fazer uma corrida de aproximadamente 12 quilômetros, a tradicional "Run Back". Agora veio uma fase mais teórica, de estudos de computação.



Uma reduto de tradições
West Point é a mais antiga guarnição militar em atividade contínua dos Estados Unidos. Funciona sobre as ruínas de um forte construído pelos pioneiros norte-americanos em 27 de Janeiro de 1778. Situada à beira do Rio Hudson, virou reduto dos rebeldes ianques na sua luta pela independência, contra os ingleses, no século 18. Com o tempo, virou academia para ensino da carreira de oficial. Os estudantes são oficiais em treinamento e são chamados de cadetes. Eles servem obrigatoriamente ao Exército, após a graduação.



Foto: Divulgação



Como está sendo esse período nos EUA?
Kizzy Terra — Em abril deste ano foi a primeira vez que vim aos Estados Unidos, para participar da competição Sandhurst na Academia Militar de West Point. Fiquei cerca de 10 dias, mas bastante focada nos treinamentos para a competição, não tivemos muito tempo para conhecer outros lugares. Agora, na minha segunda vez, a experiência está sendo muito enriquecedora e desafiadora. Assim que cheguei aqui participei de um treinamento militar de verão de três semanas. Foi bem intenso. Com o fim do treinamento, iniciou-se o período escolar, no qual tenho três disciplinas de Engenharia da Computação, curso que eu faço no Instituto Militar de Engenharia. O que mais me causou estranhamento foi a alimentação. Aqui é comum as pessoas fazerem uma grande refeição no café da manhã e, no almoço, fazerem apenas um lanchinho, ao contrário do Brasil.



Pode falar do treinamento militar em West Point? Tem aquelas coisas de matar bicho para comer?
Kizzy — Não teve aquelas "coisas de matar bicho". Foram realizadas instruções teóricas e práticas de tudo um pouco: tiro de fuzil, de morteiro e de artilharia, comunicações rádio e fio. Nós dormimos em alojamentos pré-fabricados de metal, não ficamos acampados no meio da mata durante as três semanas. Comíamos as chamadas rações operacionais no almoço, mas o café da manhã e a janta eram em um refeitório. Agora moro na Academia, em alojamentos com quartos para mulheres.



O que te levou a optar por esse caminho? 
Kizzy — Minha mãe foi professora do munícipio de Porto Alegre, agora está aposentada. Meu pai, é economista, funcionário público do estado do Rio Grande do Sul. Nenhum deles é militar. Fiz o concurso para o ensino médio do CMPA porque estava em busca de um ensino de excelência e uma boa preparação para o vestibular da UFRGS. Ainda no meu primeiro ano do CMPA eu descobri o Instituto Militar de Engenharia (IME), para onde fui após o Colégio Militar.



A rotina de West Point é muito diferente e mais rígida que a do Colégio Militar? É como o treino de uma tropa de elite? 
Kizzy — Sim, a rotina é bem diferente, entretanto não chega a ser como o treino de uma tropa de elite. Os treinamentos militares aqui são concentrados no verão. Ao longo do semestre os cadetes têm as suas obrigações militares, mas a ênfase é nos estudos. Os exercícios de adestramento físico acabaram. Estou tendo aulas teóricas, de computação.



Quais teus planos?
Kizzy — Eu estou em West Point por apenas um semestre, a missão acaba em dezembro. É um intercâmbio entre escolas militares (IME e West Point). Depois disso, voltarei para o Brasil para terminar os meus estudos no IME. Uma vez formada, serei uma oficial do Quadro de Engenheiros Militares do Exército Brasileiro.



Pretendes seguir carreira militar? 
Kizzy — Quando terminar o curso de formação e graduação no IME, serei oficial. O período mínimo que devemos ficar no Exército é de cinco anos. Quem sai antes, precisa indenizar a força.
ZERO HORA/ blog Igualdade e Identidade

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