MIA COUTO
Nasceu na cidade de Beira, Moçambique, em 1955. Poeta, jornalista, com estilo muito próprio, já foi traduzido a muitos idiomas. Dedica-se também ao teatro e à biologia.
Quissico1. Deixei o solna praia de QuissicoDe bruçossobre o Verãoeu deixei o Solna extensão do tempoMolhando, quase líquido,o dia afundavanas fundas águas do ÍndicoA terrase via estar nualembrando, distante,seu parto de carne e lua2. Não o pássaro: era o céuque voavaO ombro da terraamparava o diaA luztombava feridapingandocomo um pulso suicidaum minhas ocultas asasPoema da despedidaNão saberei nuncadizer adeusAfinal,só os mortos sabem morrerResta ainda tudo,só nós não podemos serTalvez o amor,neste tempo,seja ainda cedoNão é este sossegoque eu queria,este exílio de tudo,esta solidão de todosAgoranão resta de mimo que seja meue quando tentoo magro invento de um sonhotodo o inferno me vem à bocaNenhuma palavraalcança o mundo, eu seiAinda assim,escrevo.Fui Sabendo de MimFui sabendo de mimpor aquilo que perdiapedaços que saíram de mimcom o mistério de serem poucose valerem só quando os perdiafui ficandopor umbraisaquém do passoque nunca ouseieu via árvore mortae soube que mentiaDe "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"SolidãoAproximo-me da noiteo silêncio abre os seus panos escurose as coisas escorrempor óleo frio e espessoEsta deveria ser a horaem que me recolheriacomo um poenteno bater do teu peitomas a solidãoentra pelos meus vidrose nas suas enlutadas mãossolto o meu delírioÉ então que surgescom teus passos de meninaos teus sonhos arrumadoscomo duas tranças nas tuas costasguiando-me por corredores infinitose regressando aos espelhosonde a vida te encarouMas os ruídos da noitetrazem a sua esponja silenciosae sem luz e sem tintao meu sonho resignaLongeos homens afundam-secom o caju que fermentae a onda da madrugadademora-se de encontroàs rochas do tempoDe "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"
Nenhum comentário:
Postar um comentário