No filme “Encontro com Milton Santos – O mundo global visto do lado de cá”, é feito um recorte singular sobre a globalização, a sociedade de consumo, as divisões que esta sociedade se encontra, o território, os efeitos famigerados da globalização, as crises que esta promove, as barreiras físicas e simbólicas postas pelo capitalismo como efeito da globalização, o papel da mídia e as revanches organizadas por suas maiores vítimas.
A crise se estabelece e Milton Santos faz este alerta quando afirma que: “O consumo é o grande fundamentalismo”. E é sagaz quando apresenta as três vertentes da globalização no mundo; a globalização como é posta, a globalização da perversidade e o mundo por uma outra globalização.
No decorrer do documentário é apresentada uma série de acontecimentos no mundo inteiro que focam a atenção nas causas que esta sociedade capitalista centraliza, a fim de obter benefícios próprios em detrimento da desorganização do território, da apropriação de bens comuns e do uso privado de riquezas mundiais por parte de uma minoria. Apropriações indevidas que geraram tensões por tentar deter grandes bens nas mãos de pequenos grupos, enquanto se assolava o estado de miséria e a sociedade crônica para todo o resto.
A tentativa de privatização da água potável em Cochabamba, Bolívia em 2000 e o 3º Fórum Mundial da Água em Kioto, Japão em 2003, foram eventos que chamaram a atenção do mundo para os efeitos da famigerada globalização frente à sociedade capitalista na qual vivemos.
Em meio à crise financeira , ao estado de caos que se encontra, tem-se o crescimento crônico do desemprego, a fome e o desabrigo que cada vez mais se alastra. Os baixos salários, o estado de mendicância e miséria em que as pessoas são postas, crescem diretamente proporcional ao que chamamos do segundo efeito da globalização, ou globalização da perversidade, em que a pobreza é vista com naturalidade.
Enquanto isto, a sociedade se divide em dois grandes grupos; “o grupo dos que não comem e o grupo dos que não dormem com receio do grupo dos que não comem.” (José de Castro). E Milton Santos ainda afirma que “produzimos mais comida do que consumimos”. E esta sociedade subdividida permanece criando barreiras de segregação. Sejam estas barreiras físicas – Muralha da China e Muro de Berlim – ou barreiras simbólicas – que é a que a Europa mantém contra os estrangeiros e clandestinos, a fronteira entre o México e o EEUU, onde a migração não é desejada.
Adiante os acontecimentos tem a mídia como a fábula da globalização, que assume o papel de intermediação diante desta, pois controla a interpretação do que acontece no mundo, em que não há produção excessiva de notícias, e sim de ruídos.
Contudo, a revanche é feita. Os grupos que são massacrados e postos à margem deste processo atroz de desenvolvimento global ganham força com seus movimentos e buscam reverter a ordem de tudo que está posto. A África e a América Latina são os gigantes despertando para os problemas que lhe são causados, e que não se promovem por quem lá habita e sim pelos grandes “olheiros” e investidores de mercado que ambicionam ganhar espaço para depois explorá-lo. E não há melhor modo de fazer isto, senão criando confrontos entre os grupos para adquirirem espaços de dominação.
Com o despertar destes grandes pólos de desenvolvimento, os espaços cada vez mais são tomados e causam incômodo. Daí tem os olhares do norte x os olhares do sul, que propicia a observação da diferenças de pólos econômicos em blocos capitalistas distintos; os que produzem e os que consomem. Numa fala mais íntima do que possa representar os grupos que tem e os grupos que não tem moeda de consumo numa sociedade que impera a globalização da perversidade.
E Milton Santos afirma que: “Não há cidadania no Brasil. A classe média não requer direitos, e sim privilégios.” O estado de cidadania nos é roubado pelo jogo de interesse no qual esta classe promove. Mas Milton Santos é perspicaz ao frisar que estas ações não são promovidas de modo estanque pelo Estado, e afirma que: “As fontes criadoras de diferenças e desigualdades são mais fortes que as ações do Estado. Para isto, é necessário um Estado socializante.”
Diante deste Estado socializante a ser construído há também uma sociedade e Milton Santos é muito feliz quando diz que esta sociedade na qual vivemos ainda é um ensaio; ela nunca existiu.
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