Pesquisadores de universidades do Brasil, Estados Unidos e Inglaterra, concluíram que o número de escravizados levados para o Brasil é maior do que se estimava. Segundo os dados, que podem ser encontrados no site www.slavevoyages.org, foram cerca de 1.700.000 (um milhão e setecentos mil) africanos trazidos, na condição de escravos, para a Bahia e não 1.200.000, como afirmavam estudiosos, como o escritor e fotógrafo Pierre Verger.
“Definitivamente, agora, temos um conhecimento mais aprofundado do comércio baiano de escravos. Mas, graças ao trabalho de Pierre Verger, Luiz Viana Filho e de uma geração de historiadores, já tínhamos noção do papel da Bahia no tráfico transatlântico de africanos”, afirma o historiador Carlos Silva Junior. O pesquisador baiano está na Inglaterra, onde desenvolve uma pesquisa de doutoramento na Wilberforce Institute to the Study of Slavery and Emancipation (WISE) da University of Hull, Reino Unido e comentou a pesquisa para o portal Correio Nagô.
Até o século XIX, por ano, a Bahia importou uma média de cinco a oito mil escravizados, sendo que muitos deles eram da Angola. “Então, a Bahia tem muito de Angola”, conclui Carlos Silva, destacando ainda que a população de Angola, embora importante, desde o século XVIII era inferior numericamente aos jejes, minas e no século XIX aos nagôs. Um dado relevante para a pesquisa.
De acordo com os indicadores, quase 200 mil escravizados morreram durante a travessia do continente africano para as terras baianas, no período do tráfico. Segundo o banco de dados atualizado, mais de 1.736.308 pessoas foram embarcadas na costa da África com o destino para a Bahia. Deste total, cerca de 1.550.335 chegaram vivos ao local.
Sobre a pesquisa, o doutorando Carlos Silva Junior diz que esse novo levantamento traz uma abordagem sobre a realidade brasileira atual. “Ele [estudo] apresenta de maneira indiscutível o drama que foi o tráfico de escravos, mostra o que há de ‘África entre nós’, ajuda a entender a formação cultural da população brasileira, o legado da escravidão e da situação da população negra hoje. Que esses dados não sejam apenas números em tabelas, mas ajudem a refletir sobre o legado da escravidão na sociedade brasileira, até os dias atuais”, frisa.
Crianças escravizadas – No site Slave Voyages (em inglês, viagens negreiras, em tradução livre) estão catalogadas 35 mil viagens e registros de três séculos e meio, mostrando que houve um fluxo de 10,7 milhões de escravizados em todo o mundo. Para as conclusões, pesquisadores utilizam documentos de inúmeros países, como os Estados Unidos, Inglaterra, Brasil e de nações pertencentes ao continente africano. Manolo Florentino, um dos coordenadores da pesquisa, diz que “agora, se tem um número mais preciso”.
No total, barcos com bandeira de Portugal/ Brasil chegaram a transportar 5,8 milhões de escravizados. Em segundo lugar no número de pessoas comercializadas para a América, está o Reino Unido, com 3,3 milhões, especialmente com destino à Jamaica.
Os números mostram que houve um forte aumento na quantidade de jovens negociados nos últimos anos do tráfico de escravos, justamente quando as leis abolicionistas se recrudesceram. Nos 200 anos anteriores a 1841, por exemplo, a proporção de crianças nos navios negreiros foi de 7,6%. Só nos últimos 15 anos deste período, o índice saltou para 59,5%.
“No período ilegal do tráfico (a partir de 1831), era mais fácil para o traficante deslocar uma grande quantidade de escravos de uma região para outra se fossem crianças, já que havia entre elas menor resistência à escravidão”, explica o historiador Daniel Domingues, integrante do grupo e professor da Universidade de Missouri, nos EUA.
Carlos Silva Júnior completa: “Antes, os donos de escravos se interessavam principalmente por africanos adultos, que podiam ser colocados imediatamente para trabalhar nas fazendas de café, nos engenhos e no trabalho de ruas de cidades como Salvador e Rio de Janeiro. Mas a cobiça dos senhores de escravos, cônscios de que o fim do tráfico se aproximava, fez com que os traficantes adquirissem muitas crianças, que eram postas no trabalho”.
O estudo dos números do tráfico como um todo data de fins do século XIX e, a partir da sistematização dos dados feita por Philip Curtin, na década de 1960, como nos explica o historiador Carlos Silva Júnior. “Nas décadas de 1980 e 1990, grupos de historiadores continuaram a discutir os números do tráfico, ainda baseados nos dados do Curtin. Em 1999 uma primeira versão desse banco de dados, em CD rom, foi lançada, e em 2006 a versão online”, pontua.
O banco de dados possibilita novos registros de pesquisadores parceiros. A plataforma está dividida em duas: uma parte expõe os números dos documentos já obtidos; a outra faz projeções por meio de cálculos demográficos.
A Comissão da Verdade da Escravidão Negra da OAB-RJ (Ordem dos Advogados do Brasil) já pediu ao Consulado dos EUA auxílio para trazer ao Brasil nos próximos meses os pesquisadores responsáveis pelo site.
Da Redação do Correio Nagô
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