terça-feira, 1 de março de 2016

Du Bois e o Pan-africanismo



O sociólogo, historiador e ativista William Edward Burghardt Du Bois, nascido em 23 de fevereiro de 1868, no estado de Massachusetts (EUA), foi, ao longo da primeira metade do século XX, um dos principais nomes da luta pela justiça social e contra o racismo e é, até hoje, celebrado como o pai do movimento de tomada de consciência pelo povo negro da constante violência e violação de direitos a que era submetida.
Em 1895, concluiu o doutorado em História pela Universidade de Harvard, tornando-se o primeiro afro-americano a receber o título de doutor nessa instituição.
No ano de 1905, Du Bois, juntamente com outros ativistas afro-americanos (dentre os quais: Fredrick L. McGhee, Jesse Max Barber e William Monroe Trotter), fundou o Movimento Niágara, cujas principais bandeiras eram a luta pelos plenos direitos civis e o aumento da representação política dos negros nos Estados Unidos. Para o grupo, não bastava garantir oportunidades básicas de educação e sustento, mas sim que os afro-americanos precisavam de chances reais para obter uma formação avançada e desenvolver sua liderança.
Du Bois foi um ferrenho crítico das legislações segregacionistas (Leis de Jim Crow, que afetavam também asiáticos e outras minorias) e das práticas racistas que existiam em seu tempo, a exemplo dos linchamentos sofridos por mulheres e homens negros.
Esse grande líder fundou, escreveu e editou importantes publicações criadas com o intuito de propagar as ideias e ideais da luta pela igualdade de direitos entre brancos e negros a outros afro-americanos. Alguns dos principais periódicos com os quais colaborou foram Moon Illustrated WeeklyThe Horizon: a Journal of the Color Line The Crisis.
Em 1909, participou da fundação do NAACP (National Association for the Advancement of Colored People). Ao longo de 25 anos, foi diretor de pesquisa e publicidade, membro do corpo de diretores e editor da The Crisis, revista mensal da associação.
Inspirado por Sylvester Willians, um advogado de Trinidad, que, em 1900, organizara a Primeira Conferência Pan-africana, na cidade de Londres (Inglaterra), com o objetivo de inaugurar um movimento capaz de gerar um sentimento de solidariedade com relação às populações negras das colônias, em 1919, Du Bois realizou em Paris (França) o I Congresso Pan-Africano.
Du Bois liderou as quatro edições subsequentes do Congresso Pan-africano (Londres – 1921 e 1923,  Nova Iorque – 1927 e Manchester – 1945). Foi eleito presidente do V Congresso com o apoio de novas lideranças como George Padmore e Kwame Nkrumah, que encabeçaram o movimento de independência de Gana e Trinidad, respectivamente.
Nos últimos anos de vida, Du Bois morou em Gana, onde, a pedido de Nkrumah, agora presidente, iniciou pesquisa para confecção da primeira Enciclopédia Africana.
Du Bois, que já era considerado um dos precursores e pedra angular do movimento negro internacional, morreu em 27 de agosto de 1963, na capital ganesa, Acra, exatamente um dia antes da Grande Marcha de Washington, liderada por Martin Luther King. No ano seguinte, o governo dos Estados Unidos promulgava o Civil Rights Act, garantindo direitos iguais a brancos e negros.
Pan-africanismo
Embora possuindo o mote de unificar os povos da África, retalhados por fronteiras insensíveis à realidade da região e de suas sociedades, consequência da Conferência de Berlim (1885), que dividiu o continente em zonas de influência das potencias europeias, os ideais do pan-africanismo surgiram primeiro entre os negros afro-americanos.
O I Congresso Pan-africano ocorreu em 19 de fevereiro de 1919, na cidade de Paris e teve como principal resolução a adoção de um Código de Proteção Internacional aos Indígenas da África, que lhes garantisse o direito à terra, à educação e ao trabalho livre.
Ao longo do século XX, os objetivos do pan-africanismo tiveram sua dimensão e complexidade amplificadas, tornando-se cada vez mais ambiciosos e radicais. No IV Congresso (Nova Iorque, 1927), por exemplo, o comunicador e ativista jamaicano Marcus Garvey pregava o retorno dos negros à África, empreendimento que, de fato, ajudou a concretizar.
Enquanto isso, no V Congresso (Manchester, 1945), ganhava notoriedade outro líder natural de Trinidad, George Padmore, que lançou e aprovou manifesto que proclamava: “Resolvemos ser livres… Povos colonizados e subjugados do mundo, uni-vos.”
O Pan-africanismo influenciou a geração que constituiria os futuros líderes da África independente, dentre eles: Jomo Kenyatta (Quênia), Peter Abrahams (África do Sul), Hailé Sellasié (Etiópia), Namdi Azikiwe (Nigéria), Julius Nyerere (Tanzânia), Kenneth Kaunda (Zâmbia) e Kwame Nkrumah (Gana).
Os encontros seguintes, em Kumasi (1953) e Acra (1958), testemunharam a ruptura do movimento em duas correntes, as quais divergiam quanto aos rumos políticos a serem tomados após a efetivação do processo de descolonização do continente africano. De um lado, o grupo Casablanca, liderado pelos presidentes Kwame Nkrumah (Gana) e Gamal Abdel Nasser (Egito), de viés maximalista, defendia o fim da divisão geopolítica imposta pela Conferência de Berlim (1885), em prol da unificação da África em uma só nação, o que garantiria posição de centralidade no cenário político, econômico e militar mundial. Do outro, o grupo Monrovia, liderado pelos presidentes da Costa do Marfim, Félix Houphouet Boigny, e do Senegal, Léopold Sédar Senghor, e partidários de um pan-africanismo minimalista, entendia as fronteiras herdadas da colonização como intocáveis. Para representar os interesses do continente, esse grupo deu origem à Organização da Unidade Africana (OUA).
Não obstante, sua história nos remeter ao início do século passado, o sonho pan-africano de provocar a emergência de um sentimento de solidariedade e a consciência de uma origem comum entre os negros de todo o mundo continua a reverberar na atualidade, seja nas formas de organização política das nações africanas (em 2001, a União Africana veio a substituir a OUA), seja na linguagem utilizada pelos negros estadunidenses, os quais tratam-se uns aos outros pelo termo “irmão”, seja por meio da cultura Hip Hop ou através de reflexões acadêmicas que explicitam essa influência, como pode ser visto no livro Atlântico Negro: modernidade e dupla consciência, de Paul Gilroy.
Fonte: FCP

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